Escalpo

Escalpo

por Pedro Moreno criptadesangue.blogspot.com

Fogo, fumaça e martírio. Quando Águia Negra chegou em seu acampamento enxergou apenas isso.

Águia nasceu nesse local entre os índios Apaches. Sua força física superior era invejada, assim como sua pontaria que nada deixava a desejar. Porém o destino o colocou para trabalhar em uma das cidades do oeste. Sua mãe avisou-lhe para não confiar nos homens brancos, mas ele não deu ouvidos e acabou despedido depois de anos de trabalho quase escravo.

Retornara há poucos meses atrás e sua tribo aceitou-lhe de braços abertos. Aos poucos voltou a caçar e participar dos rituais herdados e praticados há muitas gerações. Quando estava se sentindo integrado de novo ele chega e encontra destruição.

Seus familiares e amigos foram chacinados. A maioria morreu a tiros. Alguns foram queimados e pela posição dos corpos se supõem que ainda estavam vivos quando isto ocorreu.

Águia não chorou

Ele queria ter chorado bastante a morte de toda a sua família. Mas ele não podia se dar o luxo disto. A honra de todos aqueles que morreram estava comprometida e só cabia a ele se vingar. Enquanto caminhava reconheceu os rostos de seus entes queridos. Viu sua prometida e futura esposa. Encontrou o sábio cacique, Raposa do Leste, morto e em sua face apenas a serenidade daqueles que já se foram.

O índio recolheu alguns machados e facas de escalpo. Procurou pela trilha e começou a segui-la. Aos poucos a fumaça e visão da morte se afastavam no horizonte. A trilha indicava uns três cavalos e sem nenhum tipo de carroça. Pela direção seguida é bem provável que teriam ido a Dirty Town, uma cidade conhecida por seus bordéis e pouco policiamento.

Ao entrar na cidade a trilha se misturava tornando impossível saber ao certo por onde começar. Sorte dele ainda vestir calças jeans, o que não atrairia olhares curiosos para sua pessoa. Quando passou em frente ao Saloon reparou em um cavalo preso a uma madeira. Entre o casco e a ferradura do corcel estavam penas presas. Logo ele reconheceu como sendo de algum cocar de sua tribo. Quando ergueu a cela encontrou alguns adornos feitos pelos apaches.

De súbito um homem sai pela porta e grita para que o índio não mexa no cavalo dele. Enquanto Águia abaixa a cabeça em sinal de desculpa, ele memoriza bem o rosto do maldito. Com imenso bigode negro e um capote todo empoeirado. Seu rosto é coberto por cicatrizes e ele manca da perna direita. Seu rosto era bem conhecido em algumas partes do estado por assalto. Seu nome: Jack “Bleeding Nose”

O índio olha para o céu e constata que daqui a pouco seria noite e suas ações então seriam cobertas pela escuridão. Ele sentou-se do outro lado da rua e esperou.

Passadas algumas horas apenas três cavalos ficaram na frente do Saloon. Todos os outros homens foram para suas casas ou estavam bêbados o suficiente para fazerem algum tipo de reconhecimento. Águia Negra conferiu suas facas e machadinhas. Deu um sorriso iluminado pela luz do luar e seguiu resoluto até a porta.

Antes de entrar olhou pela janela viu Jack saindo do saloon. O índio abaixou o chapéu e encostou-se à parede. O homem passou reto de tão bêbado que estava. Parou em frente aos cavalos como se tentasse se lembrar qual era o seu. Enquanto isso Águia passou furtivamente por ele e amarrou o pé do assassino na cela do cavalo.

Águia acertou a bunda do cavalo com a mão espalmada fazendo-o partir em alta velocidade arrastando Jack pela cidade. Ele já cuidara de um. Faltavam os outros.

No grupo que chacinara a tribo estava Jonathan “Freak Eyes”, conhecido atirador e apreciador de mulheres. Diz a lenda que esse matador de aluguel nunca errava um tiro. Quanto às mulheres ele as “contratava” aos montes. Incluindo uma bela mexicana que acabara de subir e aguardava ele terminar a sua dose de uísque.

Quando terminou, limpou sua boca na manga da camisa e subiu as escadas. O quarto estava escuro. Jonathan tirou sua roupa e puxou a coberta com um sorriso na boca.

Se não tivesse tomado a última dose “Freak Eyes” teria subido mais cedo e encontraria o índio pedindo à mexicana para que fosse para outro quarto e então se escondendo armado debaixo do cobertor.

Talvez para saudar o seu nome Jonathan morreu com um tiro em cada olho.

O barulho dos disparos alertou Edward “The Red”. Com suas costeletas ruivas e cartola, ele provavelmente era o mais sagaz e perigoso dos três. Começara a roubar com onze anos de idade, quando entrou para o bando de Juarez “el Loco”. Depois disso roubou diligências e bancos.

Edward engatilhou suas armas e apontou para a escada. Foram minutos de silêncio que só comprovaram a morte de seus comparsas. O suor passava pela cartola e desfilava pela testa sardenta do homem.

O dono do bar fugira e agora ele estava só com algum tipo de maluco querendo sua vida como troféu. Os minutos passavam e o suspense só aumentava.

Então um grito de guerra Apache soou dentro do saloon. Edward sentiu o frio na espinha e passou a apontar a arma para todos os lados tentando avistar de onde viera o som. Subitamente seu pé fora atingido por um tiro vindo da parte debaixo do chão. Em um só golpe Águia atravessou as tábuas que separavam o porão e o bar.

Edward gemia de dor. Quando levantou os olhos pode ver o índio caminhando em sua direção. Ele ainda tentou apontar uma arma, mas Águia a chutou para longe. O índio pegou sua faca e escalpelou o homem. Quando teve certeza que este morrera sentiu o pesar de seu coração desaparecer.

Agora sim Águia Negra podia chorar por suas perdas.