COLÓQUIO ÍNTIMO

A praia estava extremamente convidativa. As ondas cabriolavam suavemente. Era uma segunda-feira de outono. Quase um deserto de gente. De repente uma grande massa dágua subiu e encaracolou, bordando em espuma suas auréolas. Havia um feitiço no espraiar daquela onda que veio lamber meus pés, maliciosamente, como que chamasse meu corpo à imersão, pra que as águas me envolvessem, e pudessem misturar seu sal ao sal da minha pele. Contemplei o mar. Misterioso! Sedutor! Num impulso caminhei em sua direção. Senti que a areia não suportava o peso do meu corpo e se espremia, afastando-se para os lados, gravando o baixo relevo dos meus pés numa efêmera identificação. Em poucos segundos o mar estava lambuzando de carícias meu corpo nu. Mergulhei pungente em suas entranhas. Misturei prazer e medo. Ele acariciou os meus cabelos, lavou o meu suor, bebeu minha saliva. Fui mais fundo e ele cortejou-me com o balé das algas. Me perdi no tempo. Percebi que me faltavam forças para alcançar a praia. Debati-me tal qual um peixe se debate quando lhe roubam a água até que senti que não iria mais voltar. Entreguei-me à sorte! Porém o mar só queria ter um pouco de prazer. E uma onda preguiçosa deslizou. Estendeu-se até a praia, sem quebrar, deitando, sem danos, meu corpo n’areia. Ocultando de vez minhas pegadas. Varrendo para sempre testemunhas.

TAINã
Enviado por TAINã em 24/10/2008
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