APRENDENDO A SE COMUNICAR

Trim!trim!trim!

- Seis horas! Informa o despertador na cabeceira

Meio acordado e dormindo me descubro, levanto e no escuro com os braços a procurar algum apoio, sinto os pés da cama a bloquear meu pé , especificamente meu dedão que numa colisão frontal levou a pior e a dor subindo ao cérebro, chega a garganta que solta um grito, seguido de alguns palavrões, passada a dor inicial vem o lateja mento como um coração a pulsar.

Sigo apalpando as paredes até alcançar o interruptor e: click, a luz surge; ufa!

Agora arrumo rapidamente a roupa e rumo ao chuveiro e abrir o registro, sinto na pele a água fria, como se tivesse saído da geladeira, corro dela, fico do lado de fora do Box e imagino ... o que será que está acontecendo? Sem ter muito que fazer, tomo um banho frio mesmo, e logo após me visto olhando para o relógio, onde as horas me dizem que estou atrasado.

Engulo um café, forte e frio que faz arrepiar os cabelos.

E por falar em cabelos, saí de casa tão atrasado que esqueci de pentear-me, ganhando a rua, olho na direção do ponto de ônibus que está mais cheio que um formigueiro, então me penduro no primeiro que passa e assim fico até chegar na estação do metrô, e ainda tenho que pagar por ter tido o privilégio de andar num lugar VIP, com vento soprando no rosto.

Sem tempo para discutir, caminho rumo ao bloqueio, na imensidão da fila que está a minha frente, aliás, não é só uma fila são varias filas paralelas, ao olhar por cima, dá para lembrar do filme: A marcha dos pingüins; pois as pessoas ao andar, passo a passo, ficam com as cabeças balançando de um lado para o outro, parecendo pingüins andando em fila.

Bem, finalmente ultrapasso o bloqueio e na tentativa, inútil de chegar à plataforma de embarque me deparo com um mar de gente, como diria o Falcão na canção do RAPPA, e fico olhando os trens chegando e partindo absorvendo toda aquela multidão, até que também sou absorvido por um deles.

Já nem me espanto, por que apesar de parecer absurdo para muitas pessoas a maioria já está conformada, porque é todo dia a mesma coisa, e quase sempre são as mesmas pessoas, o mesmo horário, o mesmo vagão.

Estando dentro do trem, tem que se ficar na mesma posição que o deixaram, porque se ousar se mexer, poderá ficar sem apoio, ou seja se retirar o pé do lugar , com certeza ao tentar recolocá-lo no chão encontrará outro no lugar dele, então como dica,:- Fique no lugar que o deixaram e não se mexa.

Apesar de que em todas as estações que o trem parar você estará em um lugar diferente, pois a massa o fará sair do local mesmo que não queira.

Outro conselho procure não ir muito arrumadinho, pois quando sua presença não se fizer mais necessária, verá que seus trajes estarão a mercê da massa, a fivela do cinto poderá não estar mais no local habitual, bem provável que esteja na parte de trás do corpo, a camisa fora da calça, a gravata nas costas e por ai vai.

Para as mulheres então, é triste; além de saírem totalmente desarrumadas, ainda enfrentam o tal assédio, se bem que na maioria dos casos ocorre a reação imediata como:

- E aí já acabou? Engraçadinho.

Outra:

- Vai encostar na sua mãe !

E às vezes rolam até uns bofetões, rotina.

Hoje senti um clima meio diferente, eu disse clima não cheiro, se bem que as vezes a coisa fica feia.

Em meio a tudo isso, surgiu no meio do povo, um sujeito com a Bíblia na mão e bradava em alta voz; para que as pessoas se atentassem para o fim dos tempos, e que o Salvador está voltando, conclamando s pessoas ao arrependimento e essas coisas tipo sermão.

Até que em determinada estação o PASTOR, como alguns usuários já o haviam apelidado, desceu do trem, e ouviu-se um murmúrio de alívio que vinha do meio da massa, e o fala daqui e fala dali, durou até a próxima estação.

Eu notei tudo isso, e me atentei para alguns comentários, tentava esconder meu pé que estava com o dedão latejando pelo tropeço no pé da cama, para que não sofresse mais nenhum atentado.

Foi quando ouvi outro brado retumbante (belo trocadilho) que soava no meio do vagão, com estas palavras:

- Pessoal! Aí pessoal, galera do vagão, espero que possa ter de vocês um minuto de atenção, para dizer umas poucas palavras...

Ao meu lado uma senhora já de cara meio amarrada, manifestou contraria a solicitação do orador e contra-atacou com um:

- Aí, meu DEUS, é hoje o dia, parece que joguei pedra na cruz, ninguém merece!

Apesar de ter murmurado, algumas pessoas que estavam ao seu redor se fizeram solidários a sua queixa; e teve outros murmúrios que vinham de toda parte do vagão.

Apesar de perceber um clima meio hostil, o orador não se intimidou e prosseguiu:

- Olha pessoal, sei que é chato ter alguém enchendo vocês logo cedo, não vou dar sermão a vocês como o PASTOR; que acabou de descer, e também não estou vendendo nada e nem pedindo nada, além de suas atenções para o que vou dizer e continuou, ao perceber que a multidão lhe concedera o que pedia.

- Sou estudante de comunicação social, e por mais chato que possa parecer é muito difícil me expressar diante de vocês...

E continuou.

...eu, como todos vocês aqui estão apertados, uns até passando mal, pela falta de ar e pelo calor, me sirvo desse meio de transporte , todos os dias e já conheço de vista, boa parte das pessoas que estão aqui; não sei o nomes, não lhes dou saudações, não compartilho de suas tristezas e das suas alegrias, mesmo que ao observar em seus semblantes, que em alguns dias estão tristes, angustiados, felizes e alegres, com dores ou saudáveis; não me aproximo porque hoje em dia o ser humano se tornou muito individualista, não está tão solidário para os que não são de seu convívio como deveriam, não se importam com as pessoas mesmo vendo que as vezes o que ela precisa é só uma força moral, não estou dizendo que devemos ajudar financeiramente, se bem que se não for fazer falta não há mal algum, mas digo que existe neste mundo, muitas pessoas que apenas querem um pouco de atenção, uma palavra de conforto e talvez um ombro amigo para desabafar suas mágoas e dissabores...

As palavras bem colocadas do orador foram aos poucos abrandando os corações duros e amansando as expressões das pessoas, aquela senhora que havia se queixado no início, era umas das ouvintes mais atenciosas e às vezes balançava a cabeça afirmativamente, num nítido sinal de concordância com o orador; que não parou.

...ou apenas um bom ouvinte para suas queixas ou simplesmente para lhes contar os seus acontecimentos diários, e hoje criei coragem para me pronunciar com vocês, gostaria de ter em vocês todos aqui presentes, um amigo, queria me encontrar com as pessoas não só aqui no metrô, mas na rua e cumprimentá-los, saber se estão bem, se estão felizes ou se precisam de ajuda, e não quero cumprimentá-los por conhecer de vista e nem ao menos saber os seus nomes, e para acabar com isso vou começar me apresentando, meu nome é ROBERTO,...

E o orador saiu cumprimentando todos pelo vagão e aproximou-se de um senhor e disse:

...o senhor eu sempre vejo, conheço de vista somente; qual é o seu nome?

E o senhor pego de surpresa, respondeu:

- Eu me chamo João!

...então senhor João, muito prazer, tudo de bom e que tenha um ótimo dia de trabalho e um bom retorna à sua casa.

E esse espírito de amizade e confraternização, contaminou as outras pessoas e todos passaram a se cumprimentar e perguntar o nome e a se conhecerem, a propósito aquela senhora que se queixara e disse que não merecia se chama Ana Maria, tem dois filhos um é casado e a senhora Ana é avó de uma linda menininha que se chama Jessica.

Agora eu pergunto a você; que leu este texto até agora, meu nome é Altair Maciel;

E o seu qual é?