Dois criminosos na cadeia
Batiam os relógios vinte e duas horas. Era o dia uma sexta-feira. Estava a cadeia calma, naquele dia, àquela hora, até que, de repente, invadiram-la policiais, seis, a empurrarem dois homens, um, abrutalhado, o outro, franzino, ambos a espernearem, aquele a ameaçar de morte os policiais, este a dizer-se injustiçado e a afirmar que era absurdo o que faziam com ele. Com nenhum esforço, os policiais conduziram o homem franzino, que não lhes impunha resistência, à cela, e nesta o largaram; tal facilidade eles não encontraram ao conduziram à cela o sujeito abrutalhado, um brutamontes de uns dois metros de altura, a pesar uns cento e vinte quilos, e cuja figura evocava um homem das cavernas, neandertalesco; e este homem, de espírito asselvajado, impunha aos seis policiais, que o tinham agarrado pelos braços, pelo pescoço, pelas pernas, resistência que eles, tudo indicava, não iriam, sem que recebessem ajuda de mais uns dois ou três homens, sobrepujar. De fato, os policiais só se saíram bem em tal empreitada após receberem a ajuda, inestimável, de outros três policiais, sendo um destes um grandalhão quase tão espesso e poderoso quanto o brutamontes. Assim que este encerraram na cela, os policiais, esfalfados, quase sem fôlego, dela afastaram-se, enquanto ele esbravejava e ameaçava de morte todos eles e os familiares deles. Era de trovão a voz do homem, tipo assustador, de petrificar todo homem comum. Ele paralisou o seu companheiro de cela ao encará-lo, e rilhar os dentes, e bufar de raiva. O prisioneiro, o franzino, anteviu as peludas e imensas mãos de dedos grossos, nodosos, calosos, de seu companheiro de infortúnio em seu pescoço, esmagando-o, quebrando-o. Viu-se morto o homem franzino; seu corpo, no chão, a escorrer sangue de todos os poros. Engoliu em seco. Seus olhos, arregalados. O brutamontes não lhe dedicou sequer um minuto de atenção; para ele, aquele tipo franzino, pálido, era insignificante. Com um rápido olhar, avaliou-o, mensurou-o, e retornou às pragas que lançava aos policiais. Enfim, cansou-se o brutamontes. E sentou-se. Na cela, reinou o silêncio. Estavam sentados, a poucos metros um do outro, o brutamontes e o franzino. Após uns poucos minutos de silêncio, cortando-o, o brutamontes resmungou consigo mesmo, em voz alta: "Tolo! Burro! Traidor! Pegarei, pelo pescoço, aquele vagabundo; e lhe quebrarei o pescoço, e lhe enfiarei a faca no peito, na barriga, e a torcerei, para fazê-lo sofrer. Vagabundo! Traidor! Ele não me escapará! Sabe com quem mexeu, aquele pulha! Pensa que me escapará!? Eu já matei uns dez homens, já estuprei umas vinte novinhas, já assaltei bancos, já invadi casas, já roubei carros-forte. E aquele filho-da-mãe entrega-me à polícia! Ele assinou o próprio atestado de ôbito. Não ficarei muito tempo preso. Logo sairei.", e aqui, tornando à consciência de seu lugar, interrompeu-se, e voltou-se para o homem franzino que lhe fazia companhia, e perguntou-lhe, num tom de voz que fê-lo arregalar os olhos e suspender a respiração: "Ei, cara. Você sabe quem eu sou?" Recebeu de seu colega de cela, como resposta, um mover de cabeça que indicava que não, não sabia quem ele era. "Não tenha medo de mim, não, bróder.", retomou o grandalhão. "Não sou um homem mal. Não morderei você. Ao contrário do que dizem de mim, eu não sou um assassino de coração de pedra. Não mato gente todo dia; só de vez em quando, uma vez ou outra. Eu sou o Pequeno Boy. Nas redondezas de onde moro, não há quem não me conheça. E aqui estou, amigão, porque um cabra safado enganou-me, traiu-me. Mas deixe estar! Sairei daqui dentro de três anos. Ora, fui condenado a dezesseis anos; mas não ficarei, mofando, nesta espelunca, todo esse tempo: daqui sairei, por bom comportamento, em três anos. Conheço o sistema. De que me acusam? De assassinato, de estupro, de roubo, de assalto. Não nego as acusações. Matei uns vinte, estuprei sei lá quantas donzelas, assaltei não sei quantos carros-forte... Pouco importa. Em três anos estarei livre. E você, chefia, pegou quanto de xadrez?" O homem franzino, gaguejando, com voz quase sumida, respondeu-lhe: "Vinte anos." "Vinte?!", perguntou-lhe o brutamontes, sinceramente surpreso. "Vinte?! Não se preocupe, camarada. Com bom comportamento, você sai em três." "Não terei, por bom comportamento, comutação da pena.", informou o homem franzino. "Já está decidido: terei de cumprir vinte anos de prisã." "Quê!? Absurdo, amigo! Absurdo!Todo preso tem direito a sair logo, se se comporta bem." "Eu não." "O que você fez de tão grave, ô, fera?! Eu matei, estuprei, roubei, assaltei, e sairei em três anos. E você ficará, apodrecendo, nesta pocilga, vinte anos!? Qual foi o seu crime, meu querido?" "Ontem, na loja perto de casa, uma certa mulher esbarrou-se em mim, ou eu esbarrei nela, não sei, e ela me chamou de palhaço, tarado, idiota, e eu, pobre de mim! sem pensar no que lhe dizia, a perder o controle de meus nervos, a ofendi, a difamei, a maltratei, a humilhei. Chamei-a de feia." "Mas... Mas ela é feia?" "É."