*O Padre que contradisse a Bíblia

O Padre que contradisse a Bíblia

O sobrenome pomposo Alves de Oliveira, que bem caberia num lorde, não fazia a menor falta a este lorde da simplicidade. A corruptela “Padi Pedo”, por si só, já era suficiente para identificar a realeza de um homem que nascera para ser bom.

Nascido em Riachão do Dantas-SE, em 03/06/1904, foi ordenado sacerdote em 08/12/1928, ou seja, aos 24 anos de vida. Como sacerdote, esteve em várias paróquias do interior, até que foi fixado na Arquidiocese de Aracaju. Lecionava Português, Francês e Latim pelos colégios da capital sergipana, o que poderia lhe render, no futuro, uma aposentadoria.

Seus sermões eram rápidos e diretos, sabia abordar o assunto com precisão a laser e, quando estava “atacado”, não economizava adjetivos. Era unanimidade entre o clero sergipano pela santidade. Alguns padres da minha intimidade, como Marco Eugênio, hoje Bispo auxiliar de Salvador, dizia que Padre Pedro iria para o céu de batina e tudo, porque não tirava a sotaina nem para tomar banho.

Já o Padre João Batista e outros não gostavam de confessar-se com ele, pois o que tinha de solidário com os leigos, tinha de severo com os sacerdotes. Ao mínimo pecado confessado por um padre, ele já exclamava, horrorizado:

– O quê??!! Você fez isso?

E após as confissões, em vez de conselhos, dava-lhes broncas!

Magro, de passos miúdos e ligeiros, morava na Rua Capela com as irmãs, no centro de Aracaju. Vivia, permanentemente, vestido numa batina preta, muito surrada. Acordava cedo para comprar pães e comprava, não apenas para sua casa, mas uma boa quantidade para sair distribuindo aos moradores de rua.

Para muita gente, o Padre só não doava a batina, porque só tinha uma. Era voz corrente em Aracaju que Padre Pedro tinha MANIA de doar.

Certo dia, uma senhora notou que os sapatos de Padre estavam furados no solado e ficou indignada. Não sabia como um homem fino e inteligente se deixava andar tão relaxado daquela forma. Então, procurou saber, junto a uma das irmãs, o número que ele calçava. Em seguida, foi ao comércio e comprou um sapato mocassim, pele de ovo, que era um brinco de macio. Mandou enrolá-lo para presente e lhe entregou no dia seguinte. Ele recebeu o par de mocassim, todo satisfeito, agradeceu e foi-se embora.

Mas qual não foi a surpresa daquela senhora ao ver, no dia seguinte, o Padre passar para comprar pães com os mesmos sapatos furados. Ela aguentou firme aquela desfeita por dois dias, mas no terceiro dia, não suportou mais e perguntou-lhe, diretamente, por que ele ainda continuava usando sapatos velhos, se ela tinha lhe dado sapatos novos.

– Oh, minha filha! Eu dei aquele sapato a um mendigo. O coitadinho estava andando descalço neste piso quente! Nem sapatos furados ele tinha!

A mulher engoliu em seco e não disse mais nada...

Padre Pedro era irmão de J. Inácio, um famoso artista plástico. Contam que J. Inácio, um dia, ao sair do banho, não encontrou as sandálias. Padre Pedro já as tinha doado...

Acostumado com alunos pobres, Padre Pedro gastava seu salário quase todo comprando material escolar para suas alunas da Escola Normal. Certa vez, num dia de chuva, ele atravessou a rua, para emprestar seu guarda-chuva a duas alunas que recusaram a oferta. Por causa disso, tomaram uma bronca, pois ele disse que elas não poderiam assistir às aulas encharcadas e se molhou no lugar delas.

Aqui em Sergipe, existe um costume interessante: as pessoas se conhecem por duplo nome. É o nome da mulher justaposto ao do marido e o inverso também se usa. Eu, por exemplo, sou Moza de Vera.

Pois bem, temos um casal de amigos, Messias e Bernardete, que iniciaram o namoro ainda jovens. Messias queria ir ao cinema, mas Bernardete preferiu ir à Missa. Ao chegarem à igreja, sentaram-se próximo um do outro. Ao vê-los, Padre Pedro aproximou-se deles e perguntou se eram namorados. Messias, todo saliente, respondeu que sim. Imediatamente, o Padre abençoou o namoro e eles estão bem casados há séculos. Se não fosse Padre Pedro, Messias não iria conquistar aquela menina nem no dia de São Jamais! Hoje, eles são conhecidos como Messias de Bernardete e Bernardete de Messias.

No ano 2000, a TV Globo iniciou uma campanha para eleger a personalidade do Século em cada Estado. Em Sergipe, a campanha foi intensa para a eleição de Dom Luciano José Cabral Duarte, um dos mais notáveis Arcebispos Metropolitanos. Sendo eleito, seria muito justo, dada à larga folha de serviços prestados ao Estado. Dentre os seus muitos feitos, estão a criação da UFS e a cobertura da realização do Concílio Ecumênico Vaticano II para a Revista “O Cruzeiro”.

Além do arcebispo, outros ilustres nomes de ex-governadores, escritores e médicos dedicados também constavam da lista de candidatos.

Eu votei em Padre Pedro, na urna que foi instalada no Mercado Tales Ferraz. Os eleitores mostravam alegria e prazer em afirmar que ia dar “Padi Pedo” na cabeça! Não tenho dúvidas de que aquele foi o meu voto mais acertado.

E o Padre ganhou disparado. Venceu nas 75 urnas dos 75 municípios sergipanos com uma margem fantástica de 80% dos votos.

Na Bíblia Sagrada, no Evangelho de São Mateus, 4,24 e Marcos, 6,4, Jesus diz aos seus apóstolo: “Um Profeta só é desprezado em sua pátria, entre seus parentes e em sua própria casa.”

Pois bem, Padre Pedro foi um santo vivo entre nós. Amado por todos, reconhecido por todos, contradisse até a Bíblia.

Que o tenha Deus!