Sentir bater (14.05.2017)
“E espere a pancada”.
Essa frase do meu professor da Auto Escola me veio à mente no momento em que pisei bruscamente no freio, pois ele sempre disse que em uma situação em que não se tem muito o que fazer e o freio não resolve de todo, “acione-o mesmo assim e...”
Não fiquei desacordada, pelo menos eu acho que não...
Consegui sair do carro (que estava de cabeça para baixo, mas sem cheiro de gasolina presente). Eu estava com um corte perto do olho. Acho que o airbag não acionou a tempo e acabei batendo o rosto no volante. Mas ainda bem que era apenas esse corte...
A cena que vi ao sair do carro foi horrível!
Duas pessoas estavam caídas no asfalto e seu carro, completamente destruído. Percebi uma delas começando a sentar-se e, com isso, corri para socorrer a outra. Tentei ouvir sua respiração, estava muito fraca; a pulsação parou no momento em que toquei em seu pescoço.
Logo comecei a fazer a massagem cardíaca naquele rapaz, não sem antes afrouxar-lhe as roupas para facilitar uma possível respiração. Sem desritmar, gritei para ser ouvida em meio à todas aquelas vozes de curiosos que já começavam a aproximar-se do local do acidente. Pedi para darem espaço, para não chegassem tão perto. Um deles, uma moça, perguntou se eu queria ajuda com alguma coisa.
- Por favor – respondi. Ela se ajoelhou na minha frente e perguntou:
- O que posso fazer?
- Ligue para a emergência. Certifique-se de que ninguém ficou preso nas ferragens do outro carro ali. Se tiver, ligue para o corpo de bombeiros também. Consiga alguém que possa ajudar o outro rapaz. Por favor!
Ela rapidamente saiu correndo para ver o estado do outro, com o celular já em mãos.
Tentei, ainda contando os ciclos da massagem, entender o que havia acontecido: uma carreta avançou a preferencial e tomou duas faixas da rodovia em que eu e o outro carro já estávamos, uma irresponsabilidade inenarrável que, além de tudo, causou a tragédia que enchia meus olhos. A carreta não pareceu ter sofrido danos, mas tanto o meu carro como o dos rapazes ficaram destruídos.
O meu saiu capotando depois de colidir com a traseira da carreta (fazendo-a ir um pouco para a frente, como se meu carro tivesse puxado). O outro lá ficou, meio grudado na carga e está agora como se fosse indo na contramão, por causa da pancada (que foi bastante forte e nada silenciosa).
Recomeçando a contar de 1 a 30 quando, muito ao longe, escutei a sirene. Não soube dizer se era uma ambulância ou não, mas sabia que o socorro estava chegando e tive que tomar cuidado para que o alívio que senti não me fizesse descuidar do ritmo ou da contagem.
Mas meus braços, minha coluna e minha cabeça doíam muito e fiquei com medo de que aquilo me fizesse parar. Porém, naquele momento, mais do que nunca, eu sabia que tinha de aguentar mais um pouco.
A moça que ofereceu ajuda veio me dizer que o outro rapaz estava bem e que só tinha machucado o braço. Eu agradeci e pedi que ela contasse a situação para os paramédicos. Ela disse que sim e levantou-se novamente.
Não parei de contar e rezei para que chegassem mais rápido, pois não sabia se ainda podia realmente aguentar durante aquele mais...
Vi quando a ambulância parou logo ali e os paramédicos desceram para abrirem as portas de trás. Eram cinco sem contar o que estava dirigindo. Dois deles foram em direção ao outro rapaz e três vieram na minha direção.
No momento em que chegaram perto de mim, senti uma pulsação em minhas mãos que não tinha sido causada por elas. Depois outra e outra. O rapaz que eu estava massageando abriu os olhos, puxou o ar com força e pareceu procurar algo até que fixou a atenção em mim.
Tudo isso aconteceu rápido demais, pois os paramédicos já haviam começado a tratar dele e um deles me afastou para me examinar. O rapaz não tirava os olhos de mim, nem quando fui afastada e o paramédico começou a examinar minha cabeça e o corte que lá fora aberto. Eu respondia às perguntas dele sem olhá-lo, pois meus olhos estavam no rapaz em quem agora colocavam um colar cervical.
Levaram-no para a ambulância enquanto eu sentia o paramédico limpando o ferimento perto do olho.
- Eu salvei uma vida – falei, quase num sussurro.
- Salvou mesmo! – Confirmou ele, me surpreendendo pois não tinha certeza se ele tinha escutado ou não. Olhou para trás, para a maca que seus colegas levavam para a ambulância e completou: - Teríamos perdido ele se não fosse por você.
Sorri, mesmo com dor... E me senti... Não sei dizer... Me senti feliz... É, feliz... E muito bem!
Paulia Barreto