A insignificância do vendedor na feira
Dia agitado desde as primeiras horas da madrugada.
Caminhões pesados manobram pesadas mercadorias, caixas vão sendo empilhadas, barracas vão sendo armadas, lonas farfalham, gritos, risos e cumprimentos unem-se ao range-range das rodas de carrinhos de mão.
Dia claro; barracas espalhadas homens mulheres crianças cães e pombos enxameiam as vielas e as ruas do centro.
Um vendedor em particular grita aos passantes enquanto bate palmas:
“batata cebola cenoura beterraba abóbora quiabo manga maçã laranja tangerina maracujá melão uva tomate seriguela melancia abacaxi”
Ri alto trocando pilhéria com outros vendedores. Na boca lhe faltam dentes, mas o sorriso não se intimida. As mãos ágeis dividem a melancia, apalpam os melões, enchem as sacolas, apanham o dinheiro e mete-o numa bolsa a tiracolo onde no fundo moedas tintilam. A boca com poucos dentes anuncia preços negocia agradece mastiga uma refeição fria entre um e outro freguês.
O dia se estica e finda com uma chuva fina caindo.
À beira da calçada o esgoto flui levando consigo frutas podres e vidas. Ninguém nota.