O COELHO PÉ-QUENTE...

A família era numerosa, formada do pai, mãe, quatro fêmeas e seis machos. Todos tinham constituições franzinas, ainda assim poderiam ser considerados fortes. O chefe na vizinhança tinha o apelido de Coelhão, talvez porque fosse o mais velho, batalhador, sempre a procura de meios para o sustento de todos. A alcunha nada tinha a haver com sua constituição física, magro, alto e sempre temeroso, porque não sabia qual seria o destino dos demais membros. Acreditava nas possibilidades do futuro dos filhos, mas sectário do cepticismo porque não encontrava no dia-a-dia melhora de nenhum deles. A idéia fixa é o fato de todos admirar muito as suas peles, corriam o risco de serem sempre despojados do que mais valor possuía cada um.

A mulher do Coelhão, em razão de seu nome Flausina e por ser magricela, a chamavam de Franzina, isso decorria de sua atividade, lutando para conseguir comida que alimentasse seus filhos e o marido, ou derivado da fome. Nunca tinha tempo para nada, corria de um lado a outro, revolvendo e bisbilhotando a prodigalidade da vizinhança. Ela trazia de igual forma o nome de família, estranhamente, de Pinto.

As filhas mais velhas permaneciam quase sempre na choça, como se estivessem na espreita de possíveis inimigos e resguardando os irmãos, que somente podiam sair da choupana para se instruírem, por isso mesmo detentores amplos conhecimentos.

Os viris conseguiram, mercê de seus esforços, alcançar aprendizados, ensinando-os aos estranhos, cobrados regiamente, facilitando a vida da família. Ainda assim ganhavam insignificâncias, já que esses também eram pobres, dispunham de pouco, porém mais que os Coelhos.

= O COELHO LADINO =

Havia, entretanto, um Coelho que sobressaia em tudo, muito mais que os outros. Revelando saber, prestava atenção a todos os ensinamentos, por isso mesmo, era solicitado para diferentes trabalhos, chamados de intelectuais. Inegavelmente sua instrução se manifestava promissora e Coelhão depositava muita fé nas possibilidades futuras do sétimo filho, mormente quando ouviam comentários alheios à família que esse filho tornar-se-ia a reserva e esperança dos seus ascendentes.

Apesar da tenaz luta, com vias às sobrevivências, nem todos os dias a família tinha o que comer e das cercanias não podiam esperar sempre donativos ou gêneros alimentícios, pois seus integrantes já se mostravam esgotados com suprimentos de pintos e coelhos.

O desejo daquele filho pródigo no saber e a vocação de liberalidade em edificar, concorriam para dedicar-se à consonância da expressão de quantidade, sobretudo por dominar as ciências exatas. E, nesse particular é que provinham ganhos, embora pequenos, de terceiros, que mantinham dificuldades em certas matérias.

Aquele Coelho, o sétimo filho do Coelhão, recebeu o nome de Walfredo, oriundo de antigo morador da localidade que se tornara líder, mercê de sua capacidade e instrução. Walfredo exigia, porém, que seu sobrenome fosse acentuado, ninguém sabia ao certo a razão daquela insistência, para muitos decorria do vasto conhecimento do vernáculo que dominava. Outros teimavam dizer que era pedantismo para diferenciar dos demais membros da família. O caso é que ele trazia o sobrenome Pinto Coêlho (como gostava).

= OS DEMAIS MEMBROS DA FAMÍLIA =

Os demais irmãos pouco valor possuíam, se não tiveram a mesma sorte que o Walfredo, relegaram a um plano secundário os aprimoramentos desse consangüíneo, preferiram batalhar nas roças em busca de alimentos ou dedicarem a outras atividades chulas com os pés e mãos. Mesmo assim, se ufanavam do sobrenatural irmão.

Já o Coêlho se dedicava a examinar os fenômenos referentes à natureza; grandezas e formas do que ela tem de exata; a propriedade dos corpos e as leis que os regem, sem lhes alterar a substância. Não se distanciava, não obstante, do aprofundamento na pureza do falar, muito das vezes pouco entendível à família. Essas vicissitudes o afastavam da convivência doméstica, tal facilitava o Coelhão e D. Franzina, porque era menos uma boca para comer, serviu de aprendizado e hábito: - comia não quando tinha fome, mas sim ao tempo a que um amigo lhe oferecia alimento.

= ACÓLITO E LETRADO =

O tempo foi passando e seus conhecimentos aumentavam. Socorria aqueles que demonstravam deficiências nas qualificações, fornecendo seu saber, polarizando em torno de si uma infinidade de interessados em aprender e ilustrar-se. Não possuía livros, porque os recursos eram escassos; para ganhar conhecimentos e ilustrar-se valia dos colegas-alunos e quase sempre das bibliotecas. Lia tudo que vinha às mãos e muitas vezes, com a obrigatoriedade de ensinar, estudava detidamente as matérias que seriam transmitidas aos discípulos, esse método ampliava a capacidade de saber.

Walfredo dominava de forma perficiente o português, matemática, nas diferentes partes (aritmética, álgebra, geometria, trigonometria e analítica), física (só não conhecia ótica e teoria atômica), e superficialmente química, estando, portanto, apto a prestar o vestibular para engenharia.

Em Natal, Estado do Rio Grande do Norte, onde nascera, só havia uma escola de engenharia, todos prestariam exames no mesmo lugar, colegas, seus alunos e ele próprio. A concorrência não seria desvantajosa, o nível guardava proporcionalidade, em razão do limitado conhecimento de química. O número de vagas era de 45 aprovados para um contingente de 80 candidatos.

O mestre Walfredo acabou sendo aprovado em 3° lugar, Os dois primeiros lugares couberam a vestibulandos repetentes, que haviam tentado três anos anteriores, consecutivos, mais experientes e conhecedores das disciplinas habilitantes.

Não foi difícil para Walfredo cursar o 1°ano, os professores além de respeitarem pelos seus conhecimentos o consideravam, sabedores das dificuldades consistentes nas manutenções, física, didática e de transporte. Continuava o permanente obstáculo à alimentação e o deslocamento para a escola. Estudava somente com determinados colegas, nas suas casas e livros que a eles pertenciam ou na biblioteca como sempre fizera.

. Vivia numa pensão de estudantes, distante da pequena moradia dos pais, o que impedia de visitá-los com freqüência e também para não agravar o estado de penúria que passavam.

Geralmente os colegas eram abastados, filhos de latifundiários ou de políticos, que viviam enaltecendo o Rio de Janeiro. Walfredo passou a ter idéia fixa: deveria tentar a metrópole, capaz de encaminhá-lo na vida e trazer outras condições para os seus, diversas da que sempre viveram.

= O PLANO PARA SAIR DA TOCA =

Calmamente começou a traçar um plano que pudesse surtir resultado para o desejado. Amealhar recursos tornava-se impossível, o que tinha mal dava para sobreviver, tentar conseguir um empréstimo ninguém acreditaria nas possibilidades dele saldá-lo. Resolveu comentar com os colegas mais confiáveis e comunicativos sobre seus planos, pedindo inclusive sugestão e estímulo à execução. Alguns tentaram demovê-lo, até mesmo por interesses pessoais de prosseguirem nos ensinamentos de Walfredo. Outros informaram que poderiam ajudá-lo apresentando a amigos e parentes residentes no Rio de Janeiro. Objetivamente, apenas um estimulou que fosse ao porto pesquisar o preço da passagem de navio, de Natal ao Rio de Janeiro.

Coêlho assim procedeu, correu toda a doca e armadores, tentando obter qual o meio capaz de favorecê-lo. Em um navio cargueiro de 5ª categoria, a passagem era impraticável, restava apenas que seguisse como embarcadiço, executando serviço pesado que seu físico não suportaria. A única opção, compatível à sua força física, seria a de auxiliar de cozinha, mas para isso precisava contar com a benevolência do cozinheiro.Esse penalizado concordou, depois, preocupou-se ao saber que Walfredo era estudante de engenharia e ia tentar a sorte no Rio, como suportaria um serviço daquele, incompatível com suas aptidões.

O navio era uma pequena embarcação, própria para transportar sal em bruto e alguns produtos de exportação do Rio Grande do Norte, como pescado seco ou in natura, bananas, caju, especialmente os derivados, castanha e óleo, que ao chegar ao Rio de Janeiro tinham destinos diversos. Logo se notava que o aroma predominante não era nada agradável. Não se podia dizer que se tratava de uma “gaiola”, como as que trafegam no rio Amazonas, mas bem que assemelhava.

Walfredo resolveu ir ao casebre dos pais formalizar as despedidas, até certo ponto impróprias, já que na sua pessoa pairava as maiores esperanças de uma vida melhor para a família. Justificou-se, argumentando que a aventura tinha o propósito avançar na vida e conseguir melhores condições para todos. Não faltaram as recomendações e a diretriz de regresso em caso de insucesso, evitando protelar a permanência.

= A PARTIDA =

O navio partiu do porto de Natal e não de Areia Branca como inicialmente programado, numa 6ª feira, três dos colegas de Walfredo foram ao bota-fora e um deles, filho de Deputado Federal pelo Rio Grande do Norte lhe entregou uma carta do pai de apresentação do Diretor da Escola Politécnica.

A viagem transcorreu vagarosamente, parando a nau em quase todos os portos para reabastecimento de tudo, desde carvão a água e mantimentos destinados à tripulação. A milha percorrida, talvez não tivesse sua velocidade em nó, já que se arrastava lentamente sobre as águas do oceano. Levou 22 dias para chegar ao destino, atracando na Ponta do Caju, quase no último píer da doca do cais do porto. Alimentara-se mal, como todos os membros da tripulação, comia xepa, mesmo com privilégio de trabalhar na cozinha.

Walfredo, embora sem experiência nenhuma sobre cozinha, saiu-se relativamente bem, o que determinou ao cozinheiro ajudá-lo, quando o navio aportou. Não sabia onde se encontrava nem tinha uma referência capaz de dirigir-se a qualquer lugar e suas reservas restringiam aos ganhos pelos serviços prestados. Precisava, desde logo, conseguir local para dormir e aumentar o dinheiro que possuía. O cozinheiro lhe orientou que naquele lugar havia muito ladrão, que costumava assaltar estranhos, tripulantes de navio, porque sabia trazer dinheiro, guardado da viagem. O conduziu ao sindicato da estiva, a fim de conseguir trabalho para ele, sendo motivo de escárnio, dado seu franzino corpo, incapaz de suportar serviço pesado. A insistência do cozinheiro e a informação que se tratava de um estudante de engenharia, possibilitou ser empregado como apontador, função perigosa, em razão dos grandes interesses que envolviam.

= A CHEGADA NO RIO DE JANEIRO =

A malandragem imperava no cais do porto. Os trabalhadores que trabalhavam na estiva, chamados“bagrinhos”, determinavam certas vantagens que não desfrutavam, e o apontador, função conseguida por Walfredo, sofria as conseqüência. Por outro lado, o serviço era incompatível ao seu saber. Permaneceu naquele lugar por pouco tempo, tratou de retomar as atividades comuns em Natal, dar aulas particular de português, matemática e física. Foi difícil conciliar essa perspectiva e lugar que pudesse dormir e comer.

Walfredo primeiro foi aos colégios particulares, as exigências variavam, desde o respectivo diploma até o registro de professor. Resolveu ir ao encontro do apresentado, Deputado Federal, não visando matricular-se na Escola Politécnica e sim conseguir lugar, para lecionar. Solícito, o parlamentar dirigiu-se com ele a um colégio na zona sul do Rio, onde foi admitido como professor substituto, posição incerta, porém diariamente recrutável, pela ausência permanente de diferentes professores, exatamente nas matérias de sua preferência. Galvanizou, rapidamente, para si as atenções dos alunos, que chegaram ao extremo de solicitarem sua permanência nas aulas. Começaram surgir às primeiras aulas particulares, a confiança ilimitada no Professor Walfredo crescia dia-a-dia e ele teria de fazer uma programação que atendesse todos os pedidos. Havia, contudo, um problema sério de ser demovido, estava morando no último subúrbio da Central do Brasil, única pensão que conseguira antes dessas posições, indicado por um estivador.

Aquela pensão era singular, porque seus moradores, além de pouco pagarem, o faziam com impontualidade. Sem recursos a dona não tinha como subsistir e aos sábados e domingos não havia café da manhã, almoço e jantar, cada pensionista que conseguisse meios de sustento. O professor Coêlho lembrava nesses dias a penúria que passava em Natal juntamente com a família. Só havia uma saída, atacar um pomar de laranjeiras próximo e passava o fim de semana chupando laranjas...

Depois de certo tempo, com o assédio dos pais de seus alunos para conseguir encaixar seus filhos nas aulas particulares, ele as marcava para as 6ªs feiras, próximos ao almoço ou ao jantar das respectivas casas. Assim fazendo, relembrou, mais tarde, o camelo que abastecia o estômago por dois dias, compensando quando ficava sem comer na pensão.

O fato peculiar, embora de forma educada, à mesa, ainda que todos os presentes tivessem terminado a refeição, o mestre Coêlho dizia sempre, em vista de tanta insistência, --“ninguém estava insistindo coisa alguma,”-- eu aceito um pouco mais da macarronada...Era o que se chamava “comer de amigo”!

Já com recursos suficientes mudou-se para o Catete, local onde existiam inúmeras pensões para estudantes; retornando ao Deputado para que ele lhe apresentasse na Escola Politécnica a fim de conseguir uma vaga no curso de engenharia, por transferência.

Walfredo matriculou-se no 2º ano de engenharia na academia mais tradicional do Rio de Janeiro, para onde convergiam os melhores alunos da cidade, originários de colégios afamados, cujos corpos docentes guardavam profundos conhecimentos nas disciplinas básicas. Não foi difícil acompanhar o desenvolvimento dos colegas, alicerçado na cultura de que era detentor, surpreendendo professores e alunos. Precisou reforçar cálculo integral e em pouco tempo dominava a matéria, motivando a aproximação de vários estudantes que recorriam a ele na aprendizagem segura e rápida, graças ao tirocínio que possuía.

Aumentara muito o número de discípulos desejosos em aulas particular de português e matemática, obrigando-lhe as conciliações dos horários, especialmente para poderem estudar as matérias da escola politécnica. Corria entre os alunos as qualidades do Professor Walfredo, seu didático método de ensino, o tornara afamado, consistia não em dar simples aula e sim estudar juntamente com o lecionando, o que facilitava reter na memória.

Ao final do ano letivo teve a recompensa, viu todos os alunos particulares serem aprovados com ótimas notas e, paralelamente, deu ensejo que a congregação da Escola Politécnica, em reunião, houve por bem convidá-lo para ser assistente de uma das cátedras do 2° ano, sustentando na oportunidade um dos mais insignes mestres que ele, Walfredo, detinha tão vastos conhecimentos que podiam ser equiparados ao seu próprio saber. Trazia consigo invulgar modéstia, sendo incapaz de ufanar aqueles predicados, até mesmo quando seus colegas, passados para o 3º ano, lhe ofereceram um jantar no restaurante requestado da Mesbla com a participação dos mais brilhantes mestres e diretores da Escola.

Atônito diante desses acontecimentos, não sabia como melhor planejar, passar as férias em Natal ou trazer ao Rio de Janeiro seus velhos pais. Chegara o momento de compensá-los na vida que levavam no norte. Aconteceu, igualmente, um fato inusitado a mãe, de uma de suas alunas, Mônica, viúva riquíssima, de família opulenta, o convidou a passar as férias numa das propriedades rurais em Petrópolis, insistindo reiteradas vezes no convite.

Walfredo resolveu aceitar, afinal nunca passara férias em lugar algum, muito menos numa fazenda. A transformação porque estava passando, exigia uma apresentação mais condigna, sobretudo nas roupas que vestia. Resolveu adquirir num magazine masculino vestimentas compatíveis para o local das férias. Dois problemas surgiram, o principal, abrir o crediário, precisava de uma série de comprovações, depois o seu tipo se tornava incompatível com o manequim em estoque. Mas, tudo foi conseguido a tempo e no dia do deslocamento à Petrópolis não parecia o Walfredo de outrora.

= VIVENDO OUTRA VIDA =

Não obstante a educação que trazia de berço, os momentos que estava passando manifestavam-se de forma diferentes, precisava adaptar-se às circunstâncias, chegou a pensar: não deveria ter aceitado o convite. Desde os pratos servidos no café, da manhã, às demais refeições: almoço, lanche e jantar, tolhiam a liberdade de movimentar os talheres, afora as bebidas, algumas totalmente estranhas. Depois o lazer, piscina, boliche e montar a cavalo, constituíam um suplício para o humilde estudante nordestino.

A mãe de Mônica, Adalgisa, não fixava admiração a aqueles detalhes, mantinha um comportamento de estremada naturalidade, parecia em dados instantes admirá-lo, deixando transparecer certo interesse pelo professor. Ela, ainda que viúva, guardava elegância no porte físico, o que ocasionava chamar mais atenção às pessoas e convidados presentes. À noite todos se reuniam em torno de uma mesa de carteado, o que desgastava mais Walfredo, neófito inteiramente em todos os jogos de baralho, preferia ficar lendo livros de uma bela biblioteca, jornais ou revistas do dia. Adalgisa, sem demonstrar sedução, dele se aproximava, conversando amenidades, até que em determinado instante tomou a iniciativa de sondar, como seria sua vida dali para frente, se preferia continuar solteiro ou projetava se casar? A pergunta apanhou Walfredo de surpresa, despreparado para uma resposta, embora meditasse alguns momentos, vacilando deixou no ar a indagação. Naquela mesma noite Adalgisa convidou-lhe a dar uma volta entorno de um lago que ornamentava o jardim. Nascia dessa iniciativa, uma aproximação mais amável, despertando caricias de amor em ambos. Voltando à sede da fazenda, os convivas observaram que algo de estranho estava acontecendo, tanto Adalgisa como Walfredo se mostravam alegres e felizes.

No dia seguinte, logo após o café da manhã, saíram todos para visitarem às fazendas próximas. Walfredo mais desinibido conversava com Adalgisa, comentando a beleza do cenário montanhoso, o sol tentava romper a serração própria do lugar, de forma brilhante, cenário que jamais vira. Aproveitou e sussurrou viços, o que fez a perceptível dama sorrir. Depois daquele passeio deslumbrante seguiram em direção ao Museu Imperial, conhecido dos presentes, exceto Walfredo, que se admirou em ter de calçar “pantufas”, preservadora do assoalho brilhante nas diferentes dependências, onde eram exibidas as coleções de jóias, adereços, vestimentas primorosas da família real. O professor Coêlho nunca imaginou que chegaria a conhecer reminiscências do passado reinante brasileiro, manifestando-se a Adalgisa, só você e Mônica poderiam proporcionar-me tão grandioso conhecimento.

Passara rapidamente os 21 dias de férias, embora não tivesse outros compromissos, ficou triste ter de regressar ao Rio de Janeiro, só que a reiterada atividade diária na fazenda se traduzia em fatigante rotina, em especial por não andar a cavalo e jogar cartas.

Desceram a serra, coincidindo com o grande fluxo de veículos, impressionando ainda mais Walfredo, inacreditável o número de pessoas que podiam usufruir as delícias da cidade serrana; levando a pensar na existência de tamanha opulência, em contraste com seu mísero nordeste

Adalgisa voltou a perguntar ao professor, se pretendia voltar a morar na pensão de estudantes no Catete, não seria melhor que mudasse, residindo num local mais aprazível.

Não poupou as palavras, nem moderou as conseqüências, eu o convido a vir residir conosco, temos espaço suficiente e vivemos, apenas nós duas, eu e Mônica, fora as serviçais, que ocupam dependências distintas.

= A SOLIDÃO CONVINCENTE =

O oferecimento de Adalgisa deixou Walfredo contrafeito, não sabia o que dizer, depois dos maravilhosos dias de férias, poderia entender como desfeita ou até mesmo que ele estivesse pensando estar ela se jogando em seus braços, precipitando os acontecimentos, deu uma resposta seca e objetiva: - agradeço muitíssimo, no momento a solidão reforçará minhas pretensões, concluir o curso de engenharia. Não me envergonharei em vir a si na ocasião oportuna, comunicando-lhe que aceito o oferecimento.

Visitava Adalgisa constantemente, independente das aulas particulares de Mônica, que se preparava para o vestibular de arquitetura. Adalgisa aproveitava e o convidava para saírem de carro, a fim de conhecer os lugares mais pitorescos do Rio, o que nem sempre havia possibilidade, em face dos compromissos. Resolveu colocar um dos seus veículos, dirigido por um motorista, à sua disposição, facilitando seus deslocamentos.

Walfredo escreveu aos seus pais, dirigindo-se também aos irmãos, dando as notícias mais recentes, descrevendo os lugares por ele visitados e falando do interesse demonstrado por Adalgisa em manter uma convivência mais íntima. Resguardou a figura dela, mesclando comentários do seu estado civil e a situação econômico-financeira que possuía.

Coelhão lendo a carta, não deixou de relembrar seus pensamentos relacionados ao sétimo filho, sempre acreditei que ele venceria e chegaria a uma posição invejável, sentiu-se envaidecido, orgulhoso da posição alcançada.

Concluinte do curso de engenharia recebeu por antecipação várias propostas, algumas de caráter particulares, porém a que mais lhe despertou orgulho e interesse foi de inscrever-se no concurso para catedrático da Escola Politécnica, partida do corpo docente de expressão no excepcional instituto de ensino.

Nessa altura já estava noivo de Adalgisa com pleno apoio e consentimento da filha Mônica que cursava o 2º ano de arquitetura.

Precisava estudar muito em razão do concurso para catedrático. Dominava o francês, o que facilitaria o estudo em livros originários da França e o exame oral, do qual participariam professores desse país. Isso tudo ensejou mudar-se para o apartamento de Adalgisa no Leblon, teve à sua disposição um quarto e uma sala, que servia de escritório e estudos.

Com a aprovação no concurso em 1º lugar, foi logo nomeado para uma das cadeiras do 3º ano, estava impossibilitado de continuar a ministrar as aulas particulares, seu tempo ainda compreendia a chefia de um dos departamentos de engenharia da Prefeitura Municipal.

Veio a contrair núpcias com Adalgisa logo depois da conclusão do curso, quando estabilizou a situação financeira, e partiu em lua-de-mel para Europa, lá permanecendo cerca de trinta e cinco dias. Não esquecera da família que, embora não desejando vir residir no Rio de Janeiro, recebeu régia condição de melhoria destinada ao sítio por ele adquirido.

No local em que viveu durante boa fase da adolescência, ninguém esquecera da figura marcante do Coelho pé-quente!...

smello
Enviado por smello em 12/08/2007
Reeditado em 09/08/2009
Código do texto: T604031
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