O Presente

Recebi há um tempo uma caixa ricamente adornada com um presente. Não tive muita curiosidade no início porque nunca gostei de surpresas. Deixei-a num cantinho certa de que a esqueceria, assim como quem não espera nenhuma visita, nenhum brinde, nada.

No dia seguinte aquela caixa continuou lá. Vi um brilho diferente no papel e me senti irriquieta com o volume ocupando um espaço em minha casa.

Ao terceiro dia aquela caixa me intrigava e confesso que quando a recebi valorizei tanto o embrulho que não me lembrava do peso. Então, o peguei cuidadosamente, sentei-me na cama, o coloquei sobre as pernas e tive um rompante de curiosidade. Mas não o abri. Eu sabia que ali, envolto em um belo papel com laços dourados havia algo valioso e que merecia antes minha atenção antes de sair rasgando o embrulho tão meramente feito por algum especialista na arte fazer pacotes.

Resolvi então não o abrir naquele dia. Guardei-o cuidadosamente e decidi esperar.

Hora ou outra eu olhava aquela caixa e imaginava o que teria dentro dela. Muitas vezes eu visualizava exatamente seu rico conteúdo; em outras, era só especulação.

Dentre as utopias eu via um eletrodoméstico, como um processador; em outras eu via uma joia valiosa; outras imaginava uma roupa íntima; ou um sapato para sensualizar meus pés quadrados; um livro clássico; um celular de última geração; e até um ferro de passar roupas.

Mas eu sabia que não eram essas coisas que eu gostaria que estivessem ali. E sentia que não eram. Não eram porque qualquer que fosse não me agradaria, pois algo assim só iria se somar ao meu “cantinho de presentes” e ali ficaria. Um mero enfeite que recebi e ocuparia um lugar de destaque até que outro presente chegasse.

Decidi que o Presente não seria aberto. Ele iria ficar ali guardado, inviolado, intocado, jamais visto, nunca exposto a outros olhos que não os de quem me dera.

E assim passou o tempo… Milhares de vezes olhava aquele presente e via ali dentro o “felizes para sempre”; o “até que a morte os separe”, o “feitos e perfeitos um para o outro”, ou os “corações vagos preenchidos”, o “caminhar juntos na mesma direção” e muitos e muitos sonhos mais criados pelo meu olhar de esperança.

Algumas vezes via dentro do pacote lacrado viagens, passeios, construções, pontes ultrapassadas, água do mar, brisa campestre.

(…)

Recentemente abri o pacote e…. dentro dele havia exatamente aquilo que eu gostaria de receber, que busquei com afinco com minha própria atitude em não desembrulhar meu valioso presente, ao me recolher na certeza de que ali continha toda a segurança de que precisava. Não me dando ao trabalho de ver que ali dentro daquele pacote havia o que mais queria… Aos poucos, fui puxando os laços e … diante de olhos úmidos e surpresos lá estava, em perfeito estado:

um sonho de valsa.