CADEIRA DE BALANÇO

Talvez a ligação que eu tenha com cadeiras de balanço seja a memória da primeiríssima infância quando me ninavam para eu dormir.

Desde sempre, se me derem a oportunidade de escolha, sentar-me-ei em cadeiras de balanço porque, geralmente, são mais espaçosas, mais confortáveis e por causa disso nunca deixei de tê-las em casa.

Acontece que no prédio onde moro, mora também uma solteirona, no apartamento exatamente em baixo do meu e ela sempre reclama com o síndico do ruído produzido pelo movimento do balanço quando passa por aquele espacinho entre as pedras cerâmicas do piso do meu apartamento.

É um toque-toquinho de nada, mas ela faz questão de mandar o síndico ligar para mim e, logicamente, eu tenho que parar.

Para resolver o problema com a minha vizinha, lembrei que existe no mercado uns modelos de cadeira de balanço que têm a parte fixa em contato com o piso e molas para fazerem o movimento.

Tentei primeiro pela internet, numa dessas lojas virtuais que vendem até defunto com dente de ouro, mas nada encontrei. Fui nas lojas de móveis do centro e da periferia. Nada encontrei.

Um senhor, dono da lojinha perto de nada, me lembrou que eu poderia encontrar a cadeira numa loja de penhores onde, periodicamente, eles fazem leilão de móveis usados.

Foi a salvação da lavoura.

Encontrei a cadeira tão desejada.

Era um exemplar daqueles feitos por artesão competente, com várias peças torneadas e com assento forrado com couro estofado, mas o estofado já tinha ido para as cuias e para não sentar no buraco, o antigo dono colocara uma almofada dessas que têm cadarço para amarrar.

Nem precisei esperar pelo dia do leilão.

Procurei saber o valor do lance inicial e ofereci o dobro.

Fechamos o negócio e o leiloeiro me entregou a cadeira e a nota fiscal.

Feliz da vida, e vitorioso, levei minha cadeira nova (velha) para casa. Inaugurei nessa mesma noite, lendo um conto de Tolstói.

Mas o assento, apesar da almofada, era péssimo e eu resolvi recuperar o estofado original.

É sabido que, quando se vai recuperar algo, o primeiro trabalho é tentar imaginar como aquilo foi feito e desmontar com o máximo cuidado para não danificar.

Meu próximo final de semana foi todo dedicado à cadeira. Tentei deslocar as tachinhas que prendiam o couro, mas só consegui quebrar uma delas porque a haste estava enferrujada.

Virei a cadeira com os pés para cima e ataquei pela parte de baixo.

Tinha uma tábua de compensado fino, forrada com estopa já bastante danificada, pregada com muitos pregos miudinhos.

Pacientemente, tirei todos eles e consegui remover a tábua.

O algodão grosso que se usa para enchimento estava todo compactado e havia passado por entre as tiras de borracha de pneu que se usava para fazer o molejo.

Tirei todo algodão e imaginei que iria precisar de uns três quilos para poder estofar o couro novamente.

Havia num dos cantos um pedaço de couro diferente do couro do assento, mais fino, talvez pelica.

Tentei deslocar, mas ele estava colocado numa fresta entre a madeira e o couro do assento.

Imaginei que aquele pedaço de couro não fazia parte da cadeira e que talvez fossem tachinhas sobressalentes, colocadas ali pelo fabricante, para serem usadas em caso de necessária substituição de alguma danificada pelo mau uso.

Tanto mexi que o couro rasgou e para minha surpresa, aliais agradável surpresa, caíram várias joias com pedras preciosas.

Colares, anéis e brincos de esmeraldas, rubis e diamantes. Cordões, alianças e gargantilhas de ouro. E um enorme crucifixo de prata.

Eu havia encontrado uma fortuna que alguém, possivelmente abandonado pelos parentes, escondera dos herdeiros que somente viriam para o sepultamento e para a leitura do decepcionante testamento...