Leite derramado
A espanhola pegou mesmo de jeito a Onça de Pitangui. Feito cordões, os cortejos de enterro de gente do povoado e de toda sua vizinhança iam-se sucedendo aos estatalados olhos da mocinha Vicentina e de seus irmãos menores, que vinham em escadinha.
E não havia hora para surgirem aquelas apressadas e inconformadas procissões que davam uma passada breve pela igreja da padroeira Santa Ana, ou já iam direto pro cemitério do lugarejo.
No modesto casario local, acendiam-se velas, queimavam-se palmas abençoadas nos Domingos de Ramos, e se agarravam ao terço, numa latumia que das quebradas e ruas os ouvidos ensurdecia.
Quê quilo, indagavam-se os incrédulos residentes: fim do mundo, castigo divino, quê que a Onça havia feito por merecer tamanho flagelo, de que só se sabia o nome: espanhola?
E em meio às trevas e levas, com a meninada bem fraquinha, foi que o seleiro Veluziano, juntando tudo o que era trocado, determinou que Ritinha, a menos combalida saísse para comprar leite na venda vizinha.
E ainda chovia, pra anuviar o dia. Mas a esperança naquele liquido salvador animou o grupo, que se transformou em ardente torcedor do sucesso de Ritinha.
E bem sucedida ela foi, até que na volta para casa, ao dobrar um escorregadio murundu, no chão se projetou, todo o leite derramou e de vestidinho e mãos breiadas de lama pra casa voltou. Mas a danada da espanhola não a pegou!