Prima Neném
Gosto dava ver prima Neném, já enfatiotada no seu pijaminha de cetim, despedir-se de seus pais para dormir, chamando-os paizinho e mãezinha, antes do afetuoso beijinho de boa noite. Olhávamos aquela cena meio que abobados e abobadados, pois lá no nosso provincial Brumado não se conheciam aquelas encantadoras formalidades.
Era no máximo, escovar as canjiquinhas, com a inefável pasta dental Philips, lavar os pés e, na hora certa, sozinhos, puxar a coberta. Só de quando em vez sobrava tempo a papai para nos ninar com o seu galo que guebrara o bico, ou a mamãe para nos administrar um adocicado xaropico por conta da tosse...Mas enquanto Neném era sozinha, já compúnhamos uma boa turminha, de quatro ou cinco, que inda iria arranhar a barreira dos dois dígitos, até se estacionar em nove.
A prima, com quem não acordávamos, senão no sono, tinha um toque angelical nas suas madeixas surpreendentemente loiras - pois a maior parte da família era de castanhos - que deixava esvoaçar quando no alto de sua patinete, alvo mais reluzente de nossa cobiça, que inda hoje o lado infantil nos atiça. O resto, presto, era areia movediça.
A nos engolir nas fantasias, noturnas ou à luz do dia, quando é que, de criança, a alma se sacia?
E o encanto se quebrava quando a hora de retornar à casa chegava. Embarcar no lotação, vir pro centro e zarpar pro interior, sem prima Neném, caro leitor...