Tio Alfie
Tio Alfie, que na realidade era o tio-avô caçula, por parte de mamãe, era entre quase uma dezena deles, o mais regular a nos visitar, saindo de BH e chegando à Velha Serrana.
Uma vez ao ano, e se podia contar com sua presença, com a família por vezes, mas nunca sem a sua caixinha de rapé. Que cheirava fundo e nos desafiava a seguir seu caminho. Contudo, seu caminho mesmo era o da estrada de ferro, maquinista que vivia seguindo os rumos da RMV.
Sempre à procura de uma boa cachaça - e frequentemente mal-sucedido nesse quesito, pelo menos lá na nossa praça - tinha assunto pra todos. Mas, por razões óbvias, o que mais rendia papo era com papai, que não raro valia-se da companhia para alinhavar uma barra de calça, cortar uma fazenda para outra, na incansável procura de dar com panos pras mangas. Não que fosse alfaiate de profissão, mas da precisão.
Na realidade, em treinamento, chegara a meio-oficial e costurava não mais que domesticamente. Pra fora, seguia mexendo com panos, mas os da fábrica de tecidos, onde foi de medidor a chefe de terceira turma até se aposentar.
E tio Alfie ia desfiando suas histórias, suas observações. Mas o convite era quase sempre infalível, para papai acompanhá-lo numa de suas viagens de BH ao Rio, no Vera Cruz. Essa sim, era a viagem de sonhos - e sonos, pois permitia a boa dormida ao longo do sinuoso percurso. Mas valia a pena. E aí tio Alfie discorria do conforto do trem, à maravilha da cidade de São Sebastião. Quando saía de casa, levava consigo a promessa.
A vez é que não chegava, conquanto o convite se renovava, até a ponto de ser estendido para os sobrinhos mais velhos. Depois, ora pois. Foi o Veracruz que se foi e com a memória indormente do tio fomos trilhando e descarrilhando em outros rumos.