Olhar de Angelino
Foi o Edinho que me chamou pra entrar lá, quando vínhamos de volta da escola. E mesmo que a fome já fosse grande, o almoço ainda levaria um bocado de tempo. Adentramos, era um cômodo amplo, piso de tijolinhos, arejado pelas janelas e portas de antigamente, e, lá dentro, na sua faina diária, e silenciosa, trabalhava o Angelino.
Fazia gaiolas, aquele homem calvo, calmo, dos olhos dum azul profundo. Seu chapéu de feltro surrado descansava sobre a banca de carpinteiro. Vendo-nos apenas guris, que lá entravam mais por curiosidade do que para negócio, ele deu-nos pouca atenção. Na interação mais ousada, mostrou-nos uns aros de pneus velhos, no quintal adjacente, que aguardavam a queima para exporem os fios de metal, que eram objeto precioso de seu trabalho.
Havia umas gaiolas prontas, em formatos diferentes, espalhadas pelo chão. Deu até vontade de perguntar quanto custava uma delas. Mas, sem grana ou gana, refreei-me na presciência que mamãe não concordaria que a gente cativasse pássaros. E o Edinho, cheio de recursos, arranjou alguma indagação ao Angelino para preencher aquele lapso.
Quando saímos da oficina senti um certo alívio. Tava recuperando a liberdade e deixando pra trás aqueles olhos tristes de Angelino.