Duirde
Duirde era a rematada encarnação da Virgem Mãe. Nossinhora, bonita demais, para uma menina que apenas desabrochava para a vida. Quiçá, na chamada da escola fosse registrada como Edwiges, ou Edwirges, mas nunca pude conferir, pois frequentávamos educandários diferentes e ela, ao que me consta, deveria estar uns dois anos atrás de mim.
Foi o primo Maurício, de olhos verdes feito os dela, que se beneficiou de maior proximidade e até me deixou no ar, a referência a uma eventual, ou presumida, paquera. Ainda não se usava o termo paquera naquela épica época, mas na falta dum mais preciso, vamos deixá-lo aqui.
Se foi correspondido, não creio que o primo tenha alcançado essa graça, senão teria se jactado pra gente. Um contato assim, de terceiro grau, é dos milagres, o mais forte sinal.
Duirde era de uma família modesta e morigerada e o pai, embora operário, tinha dotes artísticos que cativavam. Juntava músicos ao seu alpendre e produzia serestas que encantavam vizinhos e passantes. Embora preenchesse ambos os quesitos, eu não ousava mais do que espreitar, de longe, aquele divino bulício. Me contentava com o gosto de ouvi-lo, ainda que não desse para perceber participação de Duirde.
Podia ter aprendido um pouco de violão, e o Dim da Bia, mestre precoce
nas cordas, e bom amigo, andava doudo pra me ensinar, mas me achei muito canhestro em tudo que fosse filho da pauta. E perdia aquela ceia tão lauta.
Depois, tempo corrido, fui saber, condoído, que um outro querubim levou Duirde pra longe de mim. Casou-se, foi feliz e dela, nem mesmo o primo Maurício qualquer coisa me diz. Será que esta vida tem bis?