A tia e a pia
Tia Rita estava toda contente com as reformas da casa, que ia fazendo paulatinamente, com a ajuda das irmãs solteironas. A mais recente aquisição era a pia da cozinha, lisinha, de cimento, um portento.
O asseio, que era a regra na casa, angular esteio, ganhou realce com aquele brilho, que a todos os parentes e visitantes Tia Rita fazia questão de apresentar e de ver aprovar.
Quando chegou de visita, bem rara que fazia, o primo Concesso, confesso, não foi poupado daquela primazia. Concesso, que vinha da Pedra do Indiá, trazia consigo a irmã Dica, viera à Velha Serrana para uma breve estada, e
rever toda a parentada.
Tudo bem transcorria, em meio a tanta mútua cortesia, até que um dia, quando bem cedo se levantara Rita para passar o café e, na cozinha, foi topar com o primo, em pleno uso daquele mimo: escovava a dentadura, com toda a candura, sobre a pia da Tia, aquela belezura...
Tia Rita, com tanto nojo no bojo, por polidez, lívida tez, nada fez. Mas foi como uma súbita viuvez. Esperou o primo embarcar no trem, e mais que urgente, fremente, em nenhum momento hesitou: a pia por outra nova trocou. E estou que rezou, para que o primo não mais voltasse. Graça que alcançou.
O que não alcançara contudo - e para a paz maior de consciência - fora chegar à cozinha dois minutos antes para flagrar o asséptico primo Concesso descarregando toda a liquidez
dos países baixos, de maior urgência … antes de passar à escovação da dentadura…