Nova velha vida
Quando jovem, ele nunca pôde comemorar o seu aniversário. Nunca soprou velinhas e coisas do gênero. Não tinha tempo (e nem dinheiro) para isso. Precisava trabalhar e sustentar a família. Hoje, aos 75 anos teria todo o tempo para isso. Mas não acha sentido comemorar mais um ano de velhice. Foi por por ter envelhecido que acabou parando num asilo. Hoje, sabe que esse lugar é a sua última morada. Abandonado, longe da família que ajudou a construir se vê sozinho em seu quarto que, para ele, é uma prisão. Assim como o seu corpo se transformou numa prisão. Antes, forte e disposto. Hoje, fraco e doente. Aos olhos dos filhos, deixou de ser um herói. Tornou-se um estorvo. No início, evitavam falar perto dele. Sussurravam.
Cada qual manifestava os seus poréns. "Não posso ficar com o pai". Nenhum dos quatro filhos podia. Suas pernas já não funcionavam bem e tinha problemas de saúde. Mas sua cabeça e o seu coração ainda funcionavam. À noite, chorava, sentindo o desprezo dos filhos. Lembrou de um velho cão sarnento que vivia pela vizinhança, o qual ninguém queria perto. Nem tudo eram dores. No asilo, conhecia histórias semelhantes a sua e outras, ainda mais tristes. Cada um servia como apoio e conforto ao outro. Mas ele estava só. No início, as lembranças lhe açoitavam. Outras vezes, vinham como uma brisa suave. Durante muito tempo, chorou e lamentou ter perdido a família. Fazia um ano que estava no asilo. E, numa manhã, foi surpreendido pelos outros idosos. No dia de seu aniversário, fizeram um bolo e cantaram os parabéns. Lágrimas e compreensão. Ele tinha perdido a sua família. Mas Deus lhe dera outra.