VIOLÊNCIA
O filho está de cócoras. Enquanto observa o corpo do pai estendido, as lágrimas jorram sem parar. O desempregado foi despachado no beco sujo e molhado da comunidade onde morava. O menino, mergulhado numa infância violenta agora prepara-se para se despedir do pai ainda jovem.
O homem ganhará de presente um paletó de madeira forçado e um lugar na indigência do cemitério. Depois de dois anos seus restos mortais também serão expulsos da terra para dar lugar a outro corpo engolido pela perversidade do mundo, ou melhor do submundo.
Contam-se umas vinte perfurações, muitas delas na cabeça. Crime de vingança, possivelmente. Uma dívida de jogo, uma dívida de drogas, um cigarro de maconha não pago, uma pedra de crack na cabeça e uma bala a mais. O rego onde o corpo dorme retem a água vermelha, manchada com seu sangue ainda juvenil.
A mulher, também muito jovem, guarda no ventre uma nova semente para ser plantada nos cemitérios locais, sem perspectiva, sem esperança. Agarrada a mais cinco outras crianças, de uma prole de seis, agoniza junto com os demais. O marido despreocupado não assiste mais a tudo, não se importa mais com nada, dorme, simplesmente dorme a espera da chegada da polícia e do carro que o conduzirá para sempre, sem salvas de balas.