Vila Veneza
Lá vem alguém dizer que está tudo bem e nada está acontecendo na casa do vizinho… que são essas fofoqueiras inxiridas inventando coisa… elas mentem demais! Esse povo da Vila Veneza - vamos chamá-la assim - não controlam a língua, não cuidam das próprias vidas, são invejosas, não cuidam do próprio quintal… dona Cristina e dona Russa não, essas são diferentes, elas cuidam é do que é seu e não se metem na vida de ninguém. Ademais, elas dizem que na casa do vizinho tá tudo na mais perfeita ordem, tudo tranquilo, o vizinho é gente finíssima!
Uns acreditam. Outros, não. Têm mais uns que nem se importam. Só não querem que o vizinho meta o bedelho em suas vidas, nos seus quintais. Corre à boca pequena que o vizinho herdou a casa e tem sido desleixado na conservação, tem distratado os filhos, tem se achegado a outro vizinho, um velhinho rabugento, de quem ninguém gosta… tá, mas uns vizinhos lhes tomaram as dores, começou a rolar stress na Vila Veneza. Dizem que é intriga, que ninguém tem nada que comprove o que se diz do vizinho. Se ninguém viu - talvez porque o vizinho faça o que quer que faz atrás das portas e das paredes da sua casa, bem longe dos olhares, alguém que ouviu um barulho estranho aqui, um grito ali, nada mais - é porque nada demais acontece!
Só que um dia… pra júbilo de uns, que disseram “Eu já sabia! Não falei, não falei??”; pra desgosto de outros, que precisavam ver para crer… algo maior aconteceu! Uma turba gritando, vociferando, xingando, “pega, pega, capa, capa esse sem-vergonha, capa!”, etc. Todo mundo foi ver o que acontecia, via uma senhorinha escabelada, uns senhores indignados correndo de cinta e fio de tomada na mão pra espancar seu Nicollas, que corria pelado, desesperado, pedindo “pera, gente, calma, pra quê todas essa violência??” Alguém comentou que outro dia ele mandou surrar um menino que tinha pulado seu muro pra resgatar a bola que tinha caído lá e ninguém tinha falado nada.
Depois do furdunço dona Cristina e dona Russa nem olhavam pro lado de seu Nicollas, chegavam desviar na calçada pra não lhe cumprimentar. Quem lhe defendia andava constrangido, cabisbaixo. Quem lhe acusava, agora, só tirava onda, apontava quando ele passava na rua e ria. Quem não tava nem aí, continuou assim. E a vida retomou seu caminho na Vila Veneza.