Azuis

“Casca oca

A cigarra

Cantou-se toda” Bashô

Urbanas cidadelas, redutos modernos de concentração humana teimavam em desiludir peregrinos sonhadores. Baita de uma caminhada árdua! Aos mais otimistas fácil era compreender a morte – difícil a vida. Uma vovozinha das menos alegres tomou nota do que ditava o coração: buscou refúgio nas cordas de viola. Aquele mês todo picotou diferentes as unhas da mão esquerda. Só não podia inspirar-se muito em Zé do Caixão – mas deviam ser bem compridas as da direita. Sentada em sala apertada de apartamento escapava-se pelos dedos. O olhar ia do cavalete aos braços seus seguros ao do instrumento. E toda noite no diário registrava: ‘As modas em dó hoje treinadas me fizeram recordar daqueles dias chuvosos passados em casa de meus amigos’. ‘A sova dos antigos pãezinhos doces de canela ganhou hoje outra felicidade – há notas por todas as partes!’ E assim lhe foi vindo à vontade de debruçar-se na janela em noite enluarada. Apreciava as preces dos outros reféns do concreto. Sabiá na árvore solitária da esquina e João de Barro no alto do poste de luz, anunciando o Sol do dia. E os pequeninos grilos e cigarrinhas escondidos nos vãos do mato oferecendo-lhe bons sonhos agradecidos. O vazio que antes corroia lhe explodia agora em melodias. Em seus últimos momentos abriu a velha garrafa de uísque e descongelou a garganta. Os acordes ecoados repercutiram por toda pobre vila. Encantou.