Superstição
Onofre era um escravo velho libertado com o fim da escravidão e que carregava a sabedoria negra no sangue. Fora acolhido pelo pai da miúda garota de cachos castanhos no qual nunca conseguirá perder o costume de chama-lá de sinházinha. Jamais usava camisas – sobretudo no frio - deixando sempre à mostra marcas profundas nas costas de punições cruéis. No entanto o espírito bondoso transbordava o perdão e a crença no altruísmo humano.
Nos dias chuvosos não procurava abrigo, ritualmente sentava-se debaixo do grande ipê a recusa irrefutável de abrigar-se com os demais. Há quem dizia que os anos de sofrimento haviam levado o velho Onofre a um estado de evolução espiritual, enquanto outros diziam que ele podia falar com os Deuses.
A verdade é que nunca ninguém soubera sobre seu passado, onde pertenceu um dia e se houvera dito família. Cabia unicamente a verdade de que a espreita da janela olhos pueris via-o embaixo ao ipê, sem flores e sem folhas, inerte a chuva e ao frio, incrivelmente seco com sua fogueira. Talvez fosse santo, talvez fosse somente humano ao resguardo de uma mente infantil.