DO JEITO MAIS ERRADO QUE PUDE

Caminhava lentamente sobre as poças de lama feitas pela chuva do dia anterior, sujando um pouco mais seu all star preto surrado. Nos quilômetros que se seguiam para frente não havia ninguém... - aliás, não havia qualquer resquício de vida naquele gramado íngreme molhado.

No pensamento apenas memórias de dias atrás. Ou quem sabe meses, ou anos. Tentava – sem sucesso- lembrar quando foi que tudo começou... Quando as coisas começaram a desandar.

Talvez naquela esquina errada, ou na palavra incerta, ou até mesmo quando teve a decisão certa no dia errado.

Será? Não sei. Ela não poderia me dizer, a menos que descobrisse. Porém, assim como sua memória, as lembranças também se perdiam no tempo.

No fim, continuava caminhando enquanto contemplava aquele cenário morto que sempre alerta quando uma tempestade está por vir. E infelizmente - ela sabia - a tempestade não era só o tempo. Pois também acontecia dentro de si. Uma tempestade tortuosa, um redemoinho composto de ventos que se estendiam por todas as direções.

E além desse vento confuso, não conseguia sentir nada mais.

Ou quem sabe sentisse tudo, com uma intensidade enorme, lá no fundo.

Mas depois de tantas tempestades, não podia distinguir. Talvez esse fosse o erro! Tinha certeza. Entretanto, continuava sem saber quando começou. Todas as tempestades começam lentamente, sim, assim com um pequeno frio leve. Depois alguns pingos d’água, nada notável. E a ventania começa tão aos poucos que o corpo acaba se acostumando e não percebe quando tudo já esta virando em pó. Pequenas partículas de poeira voando pelos ares...

Uma lágrima passou por sua face, escorrendo pela cicatriz, rolando pelo canto dos lábios e acabando misturada na fria poça lamacenta enquanto pensava nisso tudo. E nada mais fazia sentido.

Como foste parar ali? Naquele pequeno lugar ao lado de muitas pessoas que não sabiam nem seu nome. Como chegou até lá? Perto daqueles que lhe acolhiam com os braços, mas continuavam sem compreender seus risos desenfreados ou seu silêncio interminável. E, sobretudo, aonde foram parar seus sentimentos?

Você pensa que o gelo todo derreteu, e de repente vira para o lado e percebe que apenas olhava em uma direção. Pois, no lado, o gelo nem se rachou. E o calor do sol já foi embora. Só na próxima.

De toda forma, sabia que apesar de sempre tentar fazer do jeito mais certo que podia, acabou fazendo tudo do jeito mais errado que conhecia. Era aí onde tudo se definia. Ao menos se desses erros todos surgisse algo de bom... Poderia acreditar que não era somente um monstro. De garras sujas.

Ao menos se existisse uma forma de tonar um erro certo.

Pensando assim, até ria ironicamente dessa sua capacidade enorme de conseguir cometer tantos erros. Por mais que não quisesse, e tentasse fazer tudo direitinho. Mas, no fim, só podia resmungar para aquele vazio:

“É, tentei de todas as formas erradas. E consegui fazer tudo do jeito mais errado que pude!”

E ela sabia, e eu sei, e você também sabe que é isso que nos torna quem somos: eternos errantes dessa estrada que chamamos de vida.

De repente, assim como eu, você também consiga fazer tudo do jeito mais errado que puder.

E no fim nos juntamos para contar nossos erros. Até o momento que se tornarão certos. Ou incertos, de toda nossa incerteza!

Laís S A
Enviado por Laís S A em 19/07/2013
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