Muladeiro (capítulo XIII)
Resmungos, birras e xingamentos eram o comportamento de Antonio antes de ir à escola, pois cumprir todo o ano letivo lhe era o maior dos pesadelos. Pouca voz ativa e nenhum eloquência autoritária o pai tinha sobre o filho, que demonstrava-se irritadiço, sem mesuras nas palavras e convincente de que o seu lugar era entre os animais.
____ Santíssima Mãe de Nosso Senhor! Nem pêlo no saco esse moleque tem, e já consegue domar a criação sem medo. Onde é que ele vai parar desse jeito? - dizia Israel ao ver o garoto pelo pasto, correndo em direção aos animais, apartando os bezerros de suas mães e ensaiando laçar um boi, pelos chifres.
Para alcançar a adolescência, faltava-lhe pouco tempo, e a decisão pela vida rural lhe era inata, uma vez que abandonou os estudos sem qualquer remorso ou reflexão, mesmo tenho ciência de que o desejo da mãe era que ele fosse um Doutor, na cidade grande.
____ Eita Minduim! Deixa de ser frouxo, homem de Deus! Vem cá me ajudar! Quer que os outros te chamem de marmanjão marica! - ria, Antonio, toda vez que pedia ajuda a Minduim, para qualquer tipo de serviço que se relacionasse aos animais da fazenda.
O pai indignava-se e, ao mesmo tempo, alegrava-se com a destreza do filho, os da vizinhança diziam que ele tinha o "diabo no corpo, que era filho do demônio", Israel e Minduim não sabiam o que dizer porque nunca tinham visto coisa igual e Antonio divertia-se, aventurava-se, vez ou outra aparecia com um rouxidão nas pernas e jamais se cansava da dura labuta na fazenda.
____ Vem cá seus desgraçadinhos! Vocês vão fritar feito barriga de porco, na panela de ferro - falava Antonio, quando arrancava os carrapatos grudados em seu corpo.
Aquela cena, quase rotineira, assemelhava-se a um ritual, pois o moleque retirava-os usando um chumaço de algodão encharcado com álcool, despeja os carrapatos numa tampa velha de lata, cobria-os com sal de cozinha e ateava fogo, nas criaturinhas que, em poucos segundos, agonizavam até a morte.
Saltitante e com as mãos em "vivas" pelo ar, Antonio virava as costas, até certificar-se de que naquela tampa de lata, nada mais restava que pudesse denunciar sua ação.