Suave Decadência.

Garrafas de bebidas de todos os tipos em sua volta, o cigarro de menta entre os dedos magros de anéis metálicos. A forma como segurava o tabaco, elegante.

A forma como estava jogada no chão do quarto bagunçado, lamentável...

Não que se importasse.

Ouvindo a música mudar em seu rádio para uma mais lenta e melancólica, sentiu uma lágrima solitária descendo por seu rosto oval e sujando a bochecha farta com a maquiagem pesada dos olhos castanho sem vida, sorriu. Negando com a cabeça, limpou aquela lágrima antes que outras escapassem do choro que prendia na garganta.

Angústia.

A pele agora pálida e quase sem cor definida, com marcas arroxeadas e cortes fundos, infeccionados... Bandagens mal feitas e cicatrizes. Uma pintura macabra em uma tela maltratada com o tempo. A música parecia não ajudar e se não fosse a dor forte que sentia nos calcanhares iria se levantar e tacar o rádio contra a parede coberta por posters de bandas antigas, mas não o faria... Se levantar agora parecia estúpidez, calcanhares machucados, cortes profundos. Estúpidez.

Seus heróis mortos pela overdose.

Se morresse naquele segundo em que as gotas da chuva impetuosa batiam em sua janela não faria diferença, pois não seria heroína de ninguém... Nem de si.

Lentamente e usando mais esforço do que pensou usar um dia, levou a garrafa que jazia em sua mão esquerda até a boca de lábios cortados, sentiu o líquido descer queimando a garganta sufocada e apreciou aquele gole com mais afinco, podia ser o último. Que fosse memorável!

A bebida que sentia o gosto bom na boca, parecia trazer para si recordações do passado. Malditas lembranças!

Fora feliz um dia e não havia percebido...

Havia tido amigos, agora tinha giletes. Havia amado, agora era só. Havia sorrido, agora apenas lágrimas. Havia vivido... Agora, uma existência vaga...

Não era como em seus planos, não era como desejou, não era como queria... Não era!

Assistiu incrédula quando as mãos perderam a força... A garrafa tombando no chão com vários papéis inúteis espalhados, poemas escritos por si. Tolíce adolescente! Sorriu nostalgica.

O cigarro que espalhava o cheiro mentolado pelo quarto caído no chão ao seu lado, tão irônico quanto podia ser... Vodka e faísca se misturando. Maldita química!

Simpaty For The Devil, tocando alto. Riu alto.

Quente...

As cortinas negras, agora em labaredas...Fogo, quente, vivo!

Ódio!

Raiva!

Amor!

Tesão!

Arrependimento...

Um misto de sentimentos.

O sorriso no rosto cansado, entrando em contraste com as lágrimas de felicidade. Calor...

Quente estava o corpo que sentia a pele queimar no fogo vivo, a calça de couro negro que usava, agora completamente fundida ao corpo e a blusa já havia desaparecido. Os cabelos um dia azul, agora sem existência.

Medo.

Totalmente entorpecida, fechou os olhos e sorria. Corpo quente, alma fria.

Havia acabado sem que percebesse e tudo o que agora restava, cinzas...

Tinha apenas dezessete anos, e sempre fora certa de seu fim. Havia aguentado até ali.

Oh, suave decadência...

Aimée.

Ainda ouviu seu nome ser chamado ao longe.

Nada.

Camylla
Enviado por Camylla em 02/12/2012
Código do texto: T4016206
Classificação de conteúdo: seguro