Estranhezas do acaso
Uma particularidade notável de um dia fatídico, é que este parece ser interminável, óbvio, principalmente para quem tem um relógio à mão. Enfim, este não é o meu caso, ou não foi... Porque o que escrevo, aconteceu comigo ontem.
Estava lendo um livro em uma praça bem arborizada, não muito perto da minha casa, e, como de costume, escolhia sempre o mesmo banco para sentar-me. Eu sou realmente uma pessoa muito previsível.
Ainda não havia chegado na metade do livro, que por acaso era extremamente chato, sempre que o abria me dava sono, todavia como tinha pego este emprestado com uma amiga minha, não queria fazer a desfeita de não chegar ao fim. Tudo bem que seriam dias tediosos enquanto estivesse a brigar com essas quinhentas páginas, para que algo interessante ocorresse, mas quando devolver este bendito livro para sua triste dona, quero ter uma explicação na ponta da língua, ao taxá-lo de “enormemente chato”.
Era por volta de onze horas da manhã, não havia sequer uma nuvem no céu ou um rosto com coragem para se mostrar ao sol castigador. Uma constante brisa quente vinha beijar-me o rosto. Foi um dia bem incomum, geralmente as manhãs por essa época do ano bem amenas e calmas. Um ônibus parou à minha frente do outro lado da rua, uma moça realmente muito linda desceu, e sentou-se na parada, voltei novamente os olhos para o livro, dez minutos depois outro parou e roubou minha atenção, a moça que estava sentada subiu neste ônibus, e outra não tão bela quanto a primeira desceu, e ao invés de ficar na parada como a primeira, veio sentar-se no mesmo banco em que eu estava.
A segunda moça, era também bonita, mas o que chamou-me mesmo a atenção nela foi sua naturalidade. Ela estava com muita pressa, tenho quase certeza de que nem me viu quando tomou assento, até que ela me perguntou, sem tirar olhos da bolsa na qual remexia, se uma certa clínica pediátrica ficava por perto. Disse que sim, e sem pensar aproveitei a oportunidade fechar o livro, aquele acaso poderia se tornar uma conversa interessante, se bem qualquer coisa seria mais interessante que aquelas páginas abarrotadas de chatices desnecessárias.
Perguntei a ela se estava à procura da clínica para um provável filho seu, a resposta negativa foi um tanto curiosa, pois ela disse ser estéril, e a consulta seria para um sobrinho dela. Disse isso com uma grande naturalidade, como se fôssemos amigos de longa data.
Como ela havia se mostrada disposta para uma conversa, mesmo dando mais atenção para algo que não encontrava em sua bolsa, estendi a mão e disse meu nome para que nos conhecêssemos, ela apenas tirou um cartão não sei de quê da bolsa: -Até que enfim!, exclamou ela. Em seguida, retirou outro cartão, e me entregou dizendo que ligasse para ela, caso quisesse conhecê-la melhor. Depois se levantou e foi tão apressada, quanto quando veio.
Eu pus a cartão no bolso após ver os números sem querer decorá-los, e reabri o livro tentando encontrar a página em que estava, e, sem sucesso, fechei-o logo em seguida, levantei-me e fui para casa tirar uma soneca. “Depois ligo para ela”, pensei comigo.