Nova chance

Ele chorava tal qual uma criança desesperada, ajoelhado aos pés de São Pedro (sim, o guardião das chaves dos céus...). Chorava porque sua existência havia chegado ao fim. Seu corpo, inerte no hospital, e seu espírito desolado por uma vida inteira desperdiçada. Ele tinha chegdao ao fim de sua história e, agora, se dava conta do quanto tinha deixado de viver. Como se enganou tanto? Aquilo que chamava de vida, hoje, lhe saltava aos olhos culposamente. Tinha dedicado energia demais à coisas que não precisava tanto. Compromissos demais, vícios demais, trabalho demais, farras demais, enfim. E ele chorava, enchendo o saco de São Pedro com as suas lamúrias tardias.

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Tudo devidamente registrado pelas câmeras divinas. Nada escapava aos olhos dos anjos cinegrafistas. Todos os pecados, todas as falhas, todas as injustiças, a inércia, a má-vontade. Tudo de ruim (e de bom, claro), estava devidamente gravada em DVD. E ele assistia a tudo e chorava. Diferente de chorar assistindo ao Big Brother. Hoje, era ele quem estava no paredão, podendo ir para o inferno. Mas, São Pedro não aguentava mais o choro e lhe concedeu um benefício. Ele voltaria para a terra, para o seu corpo e trataria de continuar vivendo mais alguns anos, sem cometer os mesmos erros, buscando corrigir a sua vida. Faceiro, ele dava pulos de alegria. Seria um novo homem, cuidaria da família, seria mais digno, justo, honesto etc. E ele voltou. Acordou em meio a aparelhos, abraçou sua família, emocionado. "Tive um sonho esquisito", ele disse. E viveu feliz o resto da vida, continuando a fazer tudo errado de novo.

Márcio Brasil
Enviado por Márcio Brasil em 17/01/2007
Código do texto: T350089
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