Cartas para Madalena

Madalena abriu a pequena caixinha e sorriu para as fotos. Havia uma porção delas. Todas mostravam uma jovem incrivelmente parecida com ela, exceto pelos olhos negros e pelos cabelos cacheados.

Leonora devia ter entre 20 e 25 anos quando posou para as fotos. Uma típica estudante universitária rodeada pelos amigos, todos artistas.

A tia que estivera observando em silêncio pousou a mão sobre os cabelos vermelhos da sobrinha.

-Tem uma carta querida, você não quer começar por ela? Preciso pegar algumas coisas no escritório, vou te deixar a vontade para ler.

-Ok tia, muito obrigada. Obrigada por ter guardado tudo isso.

Daniele sorriu para a sobrinha e saiu sem dizer mais nada.

Madalena pegou o envelope amarelo do fundo da caixa e começou a ler a carta que sua mãe havia escrito um pouco antes de ter sido presa pelo Dops.

11 de Novembro de 1972

Minha Madalena

Escrevo esta carta porque acredito que não poderei mais dizer estas palavras pessoalmente. Agora que você e o papai saíram para comprar o vestido para a peça de final de ano, aproveito para lhe dar meus últimos conselhos.

Deus! Nem sei se poderei assistir sua apresentação. Perdoe-me por isso filha, mas um dia você teria que entender que os pais não podem ser eternos. Há tanta coisa que gostaria de dizer e não vou poder e para mim isso é o mais difícil.

A primeira lição que gostaria de te ensinar é que nesta vida nada é fácil, nada vem de graça. Precisamos enfrentar todos os dias os nossos piores medos. No fim, as coisas que valem mais a pena são aquelas pelas quais precisamos lutar bravamente, com unhas e dentes.

Cuide bem dos seus amigos, são eles que vão fazer sua vida plena. Não confie cegamente no amor, ele é traiçoeiro e muitas vezes vai fazer seu coração se partir em pedaços, mas lembre-se, toda regra tem uma exceção.

Aliás, minha querida, se quiser viver plenamente, busque sempre as exceções.

Aproveite bem o que a vida oferece, essa é a coisa mais difícil para os seres humanos, estamos sempre deixando escapar as oportunidades, mesmo que elas insistam em bater na nossa porta.

Um dia minha filha, você vai parar de acreditar em ideologias, vai dizer que nenhuma religião é verdadeira, que os seres humanos são essencialmente egoístas. Pois bem, anote esse dia meu amor, pois será neste dia que terá perdido sua alma.

No entanto meu amor, acima de tudo, saiba que vale a pena acreditar em si mesma, buscar a felicidade e tornar a vida dos seus semelhantes mais fácil, mesmo que essa tarefa te afaste do que mais ama, como aconteceu comigo.

Por fim, minha querida, lembre sempre que a bondade pode ser nossa maior arma em tempos de injustiça.

Da sua mãe que sempre vai te amar

Leonora Gonçalves

Calin Lolo
Enviado por Calin Lolo em 11/09/2011
Reeditado em 12/09/2011
Código do texto: T3214094