Decisões
O que somos além de eventos aleatórios do acaso? O que mais poderíamos ser? Será que todos temos algum sentido para dar a qualquer uma outra pessoa ou a nós mesmos, algum motivo a ser seguido, alguma predestinação que não nos é contada?
Estas eram as perguntas de Sales. Um homem de meia-idade que procurava respostas para os mais diversos anseios que tinha, ou tivera, em sua vida. Não que isto fosse em vão, mas desde que pequeno se sentia compelido a tanto. Se havia alguma necessidade nobre, ou sequer se era algo para satisfazer a si mesmo, ele não sabia dizer ao certo.
Ele dera um sorriso para consigo mesmo e, resignado, puxa a cadeira para perto do computador e começa a escrever algo do tipo... "Lembranças daquelas que eu tinha. Gostaria de escrever aquilo que eu gostaria bem escrever, mas as palavras me escapam e eu não tomo jeito em sabê-las escrevê-las bem.
Tive uma vida conturbada, é fato, e fico sempre imaginando se eu tive todas as possibilidades que um ser humano poderia ter numa vida útil. Se o tive, nunca notei... se nunca notei é porque, em demasia, nunca prestei a devida atenção, o que é uma pena... pois eu sei o que eu perdi e jamais poderei recuperar."
Ele olhou de soslaio para a janela que dava do seu escritório, num apartamento relativamente de tamanho médio num bairro de classe média-média numa cidade medianamente grande. Vivia no 33º andar desde prédio e tinha uma certa visão privilegiada do horizonte crescente da sua cidade.
Sempre imaginara o que poderia ter sido se tivesse feito escolhas diferentes e, claro, as imagens viam como ondas que se batiam nas praias, constantes, transparentes e cheias de vida. Ele conseguia ouvir as gargalhas, os choros, os anseios, o palpitar resoluto do coração que perdera para sempre e, sabia, que escolhas nem sempre são bem escolhidas. Ainda podia sentir o perfume dela.
"Que escolhas temos? Eu ansiava por tê-las em minhas mãos. Ansiava por tentar descobrir o limiar de todas elas e saber, antes do tempo devido, quais seriam os resultados que estas escolhas me trariam, se benefícios ou malefícios. E nesta ânsia de querer saber antes do tempo, sequer fazia as escolhas devidamente."
As escolhas devidamente... sempre pensando demais antes de aceitar aquele cargo, ou querer se acomodar pelo fato de temer o desconhecido e sempre se sentir trancado por dentro por nunca saber manusear com destreza e carinho aquele amor perdido de longa data. Mas isto não acontecia apenas com ele, e sim com todas as pessoas ao seu redor. Ele sempre dizia para os amigos e conhecidos: "Somos folhas ao vento do acaso."
Os seus pensamentos fluiam como as informações que trafegavam incessantemente pela Internet. Ele não se interrompia por nada e, mesmo que quisesse, a sua mente estava além do seu tempo. Não se conformava como as coisas iam ou deixavam de ir e tentava se impor em tudo, mas, ainda assim, as mesmas não funcionavam como deveriam, na prática.
"A verdade estava a frente dos meus olhos. O meu sangue fervia num ardor sem igual e eu não tinha coragem de seguir em frente. Por medo, por um breve medo de perder tudo o que eu havia criado ali. O pouco que eu tinha me contentava por demais, mas será que era, por demais, o bastante?"
Ele relaxou em sua cadeira e espreguiçou-se. Suspirou e esfregou os olhos, pensando... 'não era o bastante... nunca o foi o bastante, mas era tolo, infeliz tolo, que tinha medo das consequentes perdas. A coragem não me tinha dado em mão... mas porque?'
"Eu poderia ter sido muito mais do que eu sou hoje... e sinto falta, por demais, dela... das decisões que eu tomei, da forma que eu a magoei, pois havia premeditado tudo antes, eu sabia como destroçar, destruir, manipular e acabar com o que havia de bom, pois eu vi o futuro e, parte, poderia não ser tão agradável..."
E depois ele soube do que aconteceu com ela e tristemente a viu cada vez mais longe de sua vida. Seu coração, se não havia murchado, se tornado algo cinza e envolto de negrume, se tornou algo devidamente fechado, pois ela era a luz em seus pensamentos, o pulsar da vida em suas veias e o único pensamento que tinha em sua mente. E como deixou tudo escapar por uma questão de lógica dedutiva.
"Tolos são aqueles que tentam se guiar apenas por sua mente e não deixam o coração seguir o seu caminho e tolo fui eu por só saber disso momentos depois... muito tempo depois... e tudo o que eu quero, agora, é sentir o seu sorriso mais uma vez..."
Estancou, pois se viu pegando, mais uma vez, as fotos antigas que ainda tinha guardado de muito tempo em seu pendrive quase completamente destruído.
"Somente mais uma vez..."