Bonequinha de Porcelana

A primeira vez que a vi, ela estava nua. Sim nua. Primeiro eu me assustei, depois fiquei atônito. Ela era como que... de porcelana... seus lábios finos, eram feito carmim, seus cabelos e olhos, castanhos, e o rosto tinha muito de vitoriano. Eu não sabia que existia uma mulher tão bela assim. Eu fiquei como que impressionado, sem saber qual a atitude que eu tomaria, ali, naquele momento. Ela demorou a notar a minha presença porque eu não deveria estar ali. Quando me viu, ela não esboçou nenhuma reação, foi como se eu não fosse nada, ou ninguém. Abaixei os meus olhos, não porque queria abaixá-los, mas por causa dessa falsa moral que nos incutem. Eu queria mesmo, era gravá-la em minha mente, ou, sei lá... colocá-la em algum lugar que eu pudesse tê-la sempre por perto, sob meus cuidados, como um pássaro lindo e raro em uma gaiola. Ela não me perguntou e não me disse nada, mas sorriu e, que sorriso!!! Seus dentes eram como puro marfim, como era seguro aquele sorriso!! Enfeitiçou-me! Fiquei preso a ele e com os olhos abertos ou fechados eu ainda o vejo ni/ti/da/men/te.

Ela, como se tivesse consciência do poder da sua presença, ficou quieta, sorrindo, sem fazer ou falar, absolutamente, nada. Eu tive, então, que fazer alguma coisa. Levantei o pacote que trazia nas mãos e ofereci a ela, como se estivesse ali para isso. E ela caminhou, ou melhor, orbitou em minha direção, como se estivesse no espaço. Quando se aproximou, a primeira coisa que percebi, foi o perfume que emanava daquele corpo, era amadeirado, musguento, como um bosque húmido, como um milhão de pinheiros e eu senti uma vertigem tão grande que quase perdi o domínio das pernas. Foi como se cada célula do corpo dela entrasse dentro de minhas narinas e ela enchesse os meus pulmões, entrasse em minha corrente sanguínea e percorresse todo o meu corpo. Ela tomou o pacote que estava em minhas mãos, sorriu novamente e me agradeceu com uma voz tão maviosa que eu flutuei através daquele som, ele entrou pelos meus ouvidos e penetrou em meu cérebro de uma forma tão intensa que ela teve que tocar em meu rosto com a ponta de seus dedos finos para me tirar daquele torpor. Levantei meus olhos para contemplar o seu rosto, ela era ainda mais linda de perto e o seu hálito era como que uma mistura de hortelã e canela, quente como um licor. Eu estava perdido, tinha certeza, nunca mais me desprenderia daquela figura.

Ela, novamente chamou a minha atenção, pedindo para fechar a porta quando eu saísse. E eu querendo ficar ali para sempre e ela querendo que eu fosse embora. Retirei-me dali lentamente, como um que parte querendo ficar. Quando me dei na rua, o sol estava no seu ápice e eu não era mais o mesmo. Foi como se eu tivesse saído de dentro de um casulo, criado asas e estivesse pronto pra voar, tamanho a intensidade daquele encontro. Estava desnorteado, cheio daquela mulher dentro de mim, como se através dela eu estivesse descoberto todas as mulheres do mundo, a essência delas, o seu estado mais puro. Vaguei sem rumo toda aquela tarde, ouvindo Prince no meu walkman. A vida tinha um novo sentido para mim. Eu tinha apenas treze anos, mas era como se eu tivesse trezentos. Tive vontade de falar com alguém, mas o maldito orelhão engoliu todas as minhas fichas e eu tive que voltar a vagar novamente pelas ruas para acalmar aquele turbilhão que fervilhava dentro de mim.

Quando me recuperei daquela embriaguez estava muito longe da minha casa e tinha perdido o embrulho que minha mãe tinha me mandado buscar naquele prédio onde morava aquela ninfa que enfeitiçava homens. Lembrei-me que havia saído de casa com minha bike, tive que voltar a pé até aquele prédio. Por sorte a minha bike ainda estava presa à grade que cercava o prédio. Quando bati na porta do apartamento onde vivia aquela diva eu fui atendido por um cavalheirinho sem graça, que me perguntou, secamente, o que eu queria ali. Meus olhos procuravam avidamente pela figura daquela fada e o moço se aborreceu ainda mais com a minha indiscrição. Fez menção que fecharia a porta e eu, então, disse, sem graça, que tinham me mandado vir ali buscar um pacote. Foi então que ela apareceu, desta vez, vestida como uma gueixa, usando um vestido longo, de seda chinesa, vermelho, definitivamente, ela estava parecida com uma bonequinha de porcelana. Entregou-me o pacote e me deu junto, um sorriso tão farto e tão generoso que eu quase me ajoelhei para agradecê-la, mas, me contive e agradeci simples, mas, sinceramente. Quando ia saindo, ela me chamou e pediu que eu tivesse cuidado e não perdesse aquele pacote. Muito sagaz!!!

Quando sai do prédio já era noite, mas eu havia amanhecido pra vida....

Geraldo Rodrix
Enviado por Geraldo Rodrix em 05/05/2011
Reeditado em 03/07/2011
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