Pobre Clarice
Pobre Clarice
por Pedro Moreno
www.pedromoreno.com.br
blog.pedromoreno.com.br
criptadesangue.blogspot.com
Definitivamente Clarice não consegue se manter em um relacionamento. Já é o quinto namorado que a moça se enlaça e é tristemente deixada para trás por esses canalhas. Não pense o leitor que a pobre moça seja do tipo que gosta dos cafajestes ou daqueles que levam vida boa, pelo contrário! Todos eles tinham empregos dignos, respeitadores e demais atributos que valorizam o bom homem.
Mas, infelizmente, um por um todos esses “bons exemplos” foram deixando Clarice e alguns tiveram a ousadia de cravar em seu peito a adaga da substituição, mal saíram do relacionamento com a pobre e já estavam de chamegos com outro moçoila de dotes duvidosos.
Em seu quarto, agarrada a uma almofada, a moça pranteia seu último amor. Seu coração não conseguirá suportar mais nenhum perda, Clarice está condenada a cuidar de sobrinhos e chorar assistindo novelas mexicanas sobre namoros impossíveis. Nesse momento de profunda tristeza, a moça começa a lembrar de todos os seus namorados anteriores.
O primeiro parecia ser eterno. Douglas era alto e com olhos tão azuis que o céu o invejava, trabalhava com seu tio em uma contabilidade, sua barba bem aparada e suas camisas com corte perfeito faziam suspirar as moças que por ele passavam. Juraram amores à luz da lua com as estrelas como testemunhas, gravaram seus nomes em árvores e a paixão nunca parecia terminar.
Um belo dia o rapaz disse que não tinha como continuar com ela. Pobre Clarice! Sua primeira decepção amorosa lhe doeu tanto que ela ficou uma semana inteira sem sair de casa, porém quando o fez encontrou um homem que lhe faria esquecer de Douglas.
Rafael tinha os traços fortes e barba por fazer, um verdadeiro bad-boy ela pensou quando o viu pela primeira vez. Trabalhava em uma oficina de motos, gostava de andar sem camisa para mostrar suas tatuagens e seu corpo bem definido. O tolo coração de Clarice se entregou por inteiro para aquele homem que a levou em sua motocicleta para todos os lugares. Toda essa alegria durou uma semana.
Pobre Clarice!
Já não bastava ter sofrido tanto com seu primeiro namorado e agora tinha sido trocada por um mulher sem encanto nenhum. Trocada feito um trapo velho, Clarice sentiu-se só mais uma vez. Ficou um mês sem se envolver com ninguém até conhecer Marcos. O rapaz era padeiro e sempre fazia um gracejo quando Clarice passava pela manhã para comprar pão. Até o dia que ela não resistiu e topou sair com ele.
No começo do namoro Marcos sempre levava pães e doces frescos pela manhã, além de suas deliciosas baguetes. Aos poucos foi diminuindo a frequência que se viam até finalmente parou de ir vê-la. Clarice já sabia o que tinha acontecido quando Rafael não mais atendia seus telefonemas e novamente estava no fundo do poço.
Pobre Clarice!
A melancolia permaneceu por alguns meses até aparecer Carlão. Com seu jeito despojado, levava o violão para qualquer lugar, tocava canções antigas e modernas com maestria nos bares onde conseguia alguns trocados para financiar sua faculdade de música. Cabelo comprido, teatro experimental e drogas lisérgicas, pura atitude paz e amor.
E que amor!
Serenatas e declarações eram frequentes. Passeios nos parques, zoológicos e horas a fio em praças mantinham o relacionamento sempre saudável. Um dia pela manhã ele ligou dizendo que o problema era ele e não Clarice, que apenas pediu para ser poupada e não mais saiu de casa.
Com seu coração vazio, a pobre moça não sentia vontade de sair, pedia comida por telefone e fazia compras pela internet. Gostava bastante de comida chinesa, o entregador era um rapaz negro chamado Jorge, com sorriso brilhante e atitude igual.
Sim meus caros leitores, logo a moça achara um novo namorado.
Jorge tinha um dia puxado, mas mesmo assim fazia questão de ver a pequena depois do serviço. O rapaz gostava jogar futebol, videokê e Clarice, com um mês de namoro apenas futebol de videokê.
Deixada para trás por uma moçoila de dotes fartos, Clarice ainda agarrada à almofada chora copiosamente pensando nos seus namoros anteriores em seu quarto, enquanto o mundo ganha tons de cinza e perde parte de sua graça. Subitamente um assovio ecoa para dentro de teu quarto. A moça enxuga as lagrimas e chega perto da janela, embaixo um rapaz ruivo com pequenas sardas arredondadas e olhos esverdeados acena para ela.
– Oi! – grita o rapaz.
– Sim?
– Eu passei pela tua janela eu ouvi seu choro. Uma moça tão bonita assim não deveria chorar.
– Qual o seu nome rapaz?
– Lucas.
– Não quer subir Lucas?
Agora caros leitores, vocês já conseguem imaginar o destino da pobre moça, porém o inacreditável aconteceu. Na primeira semana de namoro os vizinhos já diziam que um tinha sido feito para o outro. Eles conversavam, riam e se divertiam, um casal perfeito!
Não digo que eles não brigavam. Lucas e Clarice discutiam às vezes, mas nada que abalasse tamanho sentimento que sentiam um por outro. Os dias foram passando e estes viraram meses que viraram anos e com três anos de namoro Lucas acordou cedo, vestiu sua melhor roupa e foi ao centro da cidade.
Chegou à casa de penhor e deixou seu relógio que foi presente de seu avô, com dinheiro na mão seguiu até ao joalheiro e escolheu duas lindas alianças. Rumou até a casa de Clarice, no sopé da escada passou o perfume e ensaiou o discurso. A campainha indicou que alguém chegou, a moça desceu rápido e encontrou Lucas com um sorriso enorme no rosto.
– Está atrasado – falou Clarice com severidade.
– Eu estava ocupado.
– Aposto que se encontrou com a outra!
– Não. É claro que não!
– Duvido. Vocês homens são todos iguais! – gritou Clarice.
– Eu juro que não.
– Você vai me trocar – a moça começou a choramingar.
– Eu disse que não vou – começou irritado Lucas.
– Eu sabia, você é como todos os outros! Desde o começo de namoro com cada um deles eu já sabia que eles iriam romper o namoro. Eu falava para cada um desses canalhas desde o início e eles vinham com essas desculpas! – desabafou Clarice.
– Verdade seja dita – começou Lucas – eles te deixaram provavelmente por essa sua atitude!
As palavras de Lucas bateram contra as paredes e atingiram no centro de Clarice, subitamente seus olhos ganharam o brilho de quem deslumbra a realidade. Ela ficou ali parada um tempo e nem percebeu que Lucas já tinha virado a esquina, entrou em casa e deitou-se na cama. Seus olhos fixaram no teto e ela chorou.
Pobre Clarice!