ATMOSFERA CARREGADA
Os moradores do pequeno povoado perdido na imensidão do sertão não podiam ficar parados, vendo o progresso bater as portas com a chegada da tão sonhada ferrovia que se tornará uma realidade e deixarem para pessoas estranhas, oportunistas que com certeza apareceriam no lugar para assumir poderes que lhes cabiam por direito, os moradores mais antigos e profundos conhecedores das riquezas e necessidades da região. Alertado por alguém de passagem por ali e sentindo a urgência de tomarem as rédeas da situação, procuraram se organizarem contando com a ajuda de companheiros de uma cidade vizinha que passou por este mesmo drama a tempos atrás, por época de sua emancipação.
A exceção do Seu Neco, e dois ou três comerciantes os demais membros da comissão eram pessoas simples, humildes e alguns deles até analfabetos, pois pela característica sócio econômica, nunca tiveram a oportunidade de freqüentar uma escola e muito mal, sabiam desenhar o seu nome o que chamavam de assinatura. Matutos da roça, eram porem pessoas respeitadas pelo testemunho de vida que demonstravam, sendo profundos conhecedores da natureza, da região e do ambiente em que viviam e era exatamente estas características que os qualificavam a assumir a liderança daquele povo esquecido num resto de mundo.
Emancipar o vilarejo era uma tarefa árdua e obrigava estes matutos roceiros a viajarem varias vezes para a capital do estado, sempre contando com o apoio e ajuda de alguns políticos influentes no governo que os animava, prometendo a eles a elevação do povoado a categoria de município e ao mesmo tempo em que reivindicavam o apoio político na região.
Certo dia a comitiva, orientado por um destes político, rumaram as pressas para a capital, confiantes pois o homem informará que esta era a tacada final do processo, desta vez iriam conversar diretamente com o governador que já estava ciente do quadro e do momento político e econômico em que a região estava passando e com certeza iria assinar o decreto dando a emancipação ao povoado, elevando-o a categoria de Município, com direito a prefeitura, câmara e tudo mais.
Estavam eles no Palácio do Governador, aguardando para a audiência marcada. O movimento de entra e sai dos políticos engravatados daquela casa era intenso, e todos ao passarem pelos sertanejos os cumprimentavam sorridentes e dos conhecidos, ate ganhavam um abraço com direito a tapinha nas costas. O dia estava calorento e lá fora, o céu nublado indicava que, com certeza a chuva não demoraria cair. Um dos matutos cansado da espera, foi até porta de entrada do palácio, onde no jardim, próximo a escadaria que dava acesso ao prédio existia um pé de mamão magnífico, carregadinho de frutos.
Um dos políticos, ao sair do Palácio passou pelo bondoso homem que estava em pé na escadaria da entrada observando o belo mamoeiro carregado de frutos, e comentou :
_______ Que beleza companheiro, veja como a atmosfera esta carregada!
O homem disse isso alegando a chuva que não tardaria chegar, desceu as escadarias do palácio e foi embora. Também seu Neco, membro da comitiva, já cansado da espera, levantou e caminhando lentamente para espairecer um pouco e esticar a pernas, chegou próximo ao caboclo que, imediatamente quis mostrar ao companheiro o seu novo vocabulário e apontando para o majestoso pé de mamão, disse:
_______ Veja como a “timosfera tá carregada”, Neco !
Um dos membros da comitiva veio correndo chamar seu Neco pois o governador iria recebê-los.