PÔR-DO-SOL NA PARAÍBA
Chegamos à Praia do Jacaré, em Cabedelo, e, antes de tomarmos os nossos lugares no restaurante, para assistirmos o Bolero de Ravel, tocado por Jurandir do Sax, dei uma volta na feirinha de artesanatos.
-Boa tarde!
-Boa tarde, dona! A senhora é daqui?
-Não, sou de Vitória, do Espírito Santo, e você?
-Eu nasci neste bairro. Nascemos debaixo de um cajueiro.
-Como?!
-Foi assim: minha mãe, com uma barriga muito grande, com dois nenéns, saiu de casa com meu pai e parou para descansar na sombra da árvore.
-E daí?
-Aí, ela passou mal e papai foi correndo buscar a parteira, que cortou o meu umbigo e o do meu irmão. Ela ainda é viva e é minha madrinha; eu a chamo de mãe.
-Qual é o seu nome?
-Cláudia e meu irmão é Cláudio, mas ele sofreu um acidente e morreu.
-Que maneira diferente que vocês vieram ao mundo!
-Pra senhora ver. Naquela época, não tinha energia elétrica e nem água encanada por aqui.
-Você tem outros irmãos?
-Sim, mamãe teve doze filhos.
-Todos debaixo do cajueiro? É brincadeirinha.
-Depois de nós dois, ela teve três casais de gêmeos: meu irmão e minha irmã; meu irmão e minha irmã e meu irmão e minha irmã.
-E os outros?
-Esses foram fáceis, dona. Nasceu um de cada vez.
A vizinha de barraca exclamou:
-Vixe Maria! Há quantos anos trabalhamos juntas, nesta feira, e você nunca me contou isto!
-Venha cá, venha cá!
-Aonde?
-Naquela barraquinha. A mulher conheceu Cláudio, quando era vivo.
-Não é necessário. Acredito em você.
-Ei! Não foi que meu irmão morreu de acidente?
-Foi.
-E não é que a minha madrinha ainda está viva?
-É.
-Cláudia, agora vou para o restaurante. Foi muito bom conversar com você. Meu esposo e eu vamos ver o pôr-do-sol e conhecer o Jurandir do Sax. Dizem que é lindo.
-É muito bonito, mesmo, dona! Ele toca essa música, dentro de um barquinho, todo santo dia. Hoje é de numero 3.303. Depois que o sol se põe, uma moça linda, que se chama Isabele, toca violino, dançando. A senhora vai gostar. Ah... Às dezoito horas, os dois tocam juntos a Ave Maria.
-Nossa, deve ser maravilhoso! já vou. Tchau, Cláudia!