SÉRIE: MULHERES DO BRASIL – A SIMPÁTICA II
Estava reunindo as moedas do porta-treco, e contando-as para pagar o pedágio da Rota 116, quando o seguinte diálogo chamou-me a atenção naquela manhã fria de inverno:
- Vê se pode! Ficou me cantando com a mulher do lado...
- O quê?
- O cara daquele carro preto lá; olha. Ele estava me cantando e a mulher dele estava do lado...
A moça do pedágio falava isto para a sua colega de trabalho e eu tentando entender o que estava acontecendo. Estendi a mão com todas as moedas que conseguira reunir e quando as depositei na mão da moça, quase desmaiei: uma linda loira, com um sorriso de orelha a orelha, estendia a mão em minha direção para receber o dinheiro, enquanto seu rosto se abriu em lindo sorriso e seus lábios recobertos de um batom vermelho Ferrari, pronunciavam um sensual “bom dia!”
A moça passou a contar a penca de moedas que lhe dera - devia haver ali bem mais de quarenta peças de uns miúdos centavos -, e eu tive tempo suficiente para examinar a bela mulher que, alojada na cabine do Pedágio, esbanjava uma simpatia espontânea, escrachada, escancarada, ardente. Era final de mês e tive que lançar mão do depósito de moedas do carro para garantir ao menos o pagamento do pedágio naquele instante.
Diferentemente de outros tipos de mulheres simpáticas – que só o são quando se lhes dá ocasião para apresentarem sua simpatia – Raquel era o que se poderia chamar de a simpatia em pessoa. Ao mesmo tempo em que levantei os olhos para acompanhar a direção de onde me vinha voz tão maviosa, divisei seu nome no crachá de trabalho e fui tomado por um sorriso contagiante, uma simpatia invasiva que quase me convidava a gargalhar, a sair do meu marasmo, abandonar o mutismo e cantar com a MPB que a vida é bonita, é bonita e é bonita...
Raquel era o tipo de mulher que não pedia licença para sorrir. Simplesmente sorria e sorria sempre. Não buscava ocasião para ser simpática. Ela era a própria simpatia. Seu sorriso expulsava qualquer nuvem sombria. As tristezas iam embora ante a sua fulgurante presença. Era o tipo de mulher que acordava com um sorriso na face e ia dormir sorrindo após umas boas escovadas de dentes alvos e brilhantes, sempre bem tratados.
Pensei comigo mesmo: “E não tinha razão o desconhecido do carro da frente?! Ela escancara a sua simpatia sobre a gente e depois reclama de que está sendo cantada!”
Não me restou alternativa:
- Tem compromisso para hoje à noite???