Dos movimentos do mundo amplificados nos quadris de Rosa Maria.
Sertão velho de guerra que só distribuía uniformemente o calor e a poeira fazia, entretanto, suas festas, porque - Deus do Céu - a pessoa tem que se ri mode alguma coisa, né não?
Importava lá que os grandes andassem de caminhonete, fossem donos de terras e gado e também de gentes? Essas gentes sabiam festejar seus santos, engrolar suas rezas, fazer seus acordos com Deus e os santos, botar no andor Nossa Senhora do que tivesse na época e plantar Padrinhos Cíceros nas praças, dentro de capelinhas azuis e inocentes, de onde o quase-santo lançava olhares horrendos sobre os pecados do povo, já que a classe A, embora também o venerassem, tem seus pecados perdoados. São ricos, os coitadinhos, não tem outro jeito senão pecar.
Nessa terra de calor, poeira e injustiça, nasceu o Zé. Somente Zé, que devia ser da Silva, dos Santos ou Gomes, ou Santana ou da Conceição, enfim desses nomes bem comuns, nunca se soube; genuínamente da terra, sem os "F's e R's" das estranjas.
O Zé, que cresceu mofino, bem nos pés de Seu Basto e Dona Inhana, mas deu pra taludo, caixa dos peitos bem larga, barriga dura e pernas fortes. Quem disse que farinha, feijão e charque não dão sustância? Os olhos do Zé eram verdes. Teve tanto holandês por aqueles sertões que de vez em quando apareciam olhos verdes, azuis ou amarelos, bem no meio do povo. O cabelo liso era explicado pela avó, índia pura, tirada da mata a dente de cachorro, que paria os filhos sozinha e não falava nada com nada ou coisa com coisa, mas que ninguém desobedecia, por medo.
Trabalhador do eito, devoto de Nossas Senhoras diversas, o Zé ia "loitando a lida, porque da vida Deus que cuida", sempre de olho espichado pra Rosa Maria, uma coisinha baixinha, redonda e alourada - nela o sangue dos holandeses perduraram, embora o cabelo fosse o tuim dos antepassados negros - doida "barrida" por um forró, motivo pelo qual se desengraçou do Zé. O bestão não dançava, parecia que tinha engolido um pau de vassoura, todo duro.
Pois bem, o Zé casou mesmo com Margarida, crente que achava forró coisa do diabo e que paria com facilidade de égua de raça.
ainda hoje o Zé gosta de apreciar um forró. Sozinho, porque a Margarida não vai, mas lhe parece, assim de improviso, que enquanto se requebrarem no mundo os quadris bem torneados de Rosa Maria, o mundo tá mesmo no seu canto e dalí não sai tão já.