PARÁBOLA PARA OS NOVOS TEMPOS
Havia um lugar, onde a alegria imperava e o mar azul encantava. O sol ali brincava de colorir cada pedaço da vida e exibia-se faceiro durante um certo período a que chamavam verão. Nesse tal de verão, ele dominava e só se recolhia depois de encantar e provocar até aplausos de uma platéia fiel, que teimava em se reunir no final da tarde, buscando um lugar privilegiado para ver sua exibição de fim de dia, à qual chamavam pôr-do-sol.
Naquele lugar, as pessoas pareciam felizes e alegres, contemplativas e desconfiadas, mas, ainda hoje, não se sabe se elas eram realmente alegres ou se haviam se habituado a sorrir. No entanto uma coisa ninguém podia negar: era uma gente forte, sim. Forte e, acima de tudo, otimista.
Foi sorrateiramente, quase sem se perceber, que a violência, o medo, a hipocrisia, a competitividade, o consumismo exagerado foram tomando conta daquele reino que tinha uma mata tão grande, que garantia boa parte do oxigênio, de outros reinos mais distantes, inclusive!
Havia também pessoas que foram sendo empurradas e “escondidas” em pequenas aldeias que ficavam no alto, em condições pouco confortáveis. E elas eram muitas! Ainda, jogados em cantos mais distantes, alguns conseguiam viver sem água, luz e mesmo alimentos importantes para o seu desenvolvimento, mas era curioso...eles sorriam!!! Dançavam!!! Desdentados, maltrapilhos, famintos, doentes, mas sorriam!!! Logo, como pode se ver, aquele lugar foi dividido em grupos: os que podiam tudo, os “bonitos” e os que nada possuíam, muito menos o direito de viver, eram os “feios”. O curioso era que, sem aqueles pobres miseráveis, os “bonitos” não conseguiam viver, pois a eles cabia o trabalho mais difícil, pesado, que garantia a sobrevivência de todos.
Muitos diziam que os jovens daquele reino dos “bonitos”, além de não conseguirem ver além do seu próprio mundo, jamais se preocupavam com os outros jovens, os que estavam lá em cima, ou muito distantes..
E, assim, as pessoas estavam condenadas a viverem em territórios diferentes.
Mas, um dia, uns jovens do lado “bonito” resolveram se juntar e criar um Circo. Eles pensaram que poderiam dividir o que tinham com os que estavam do outro lado. Fizeram danças que encantaram, prepararam doces e bolos maravilhosos. Uma das mães, mesmo com a alma chorando, fez um enorme bolo, que mais parecia uma coisa do céu. O bolo da paz, da alegria, com seu doce cheio de cores e beleza, contrastando com o sal das lágrimas dos que sofriam. Compraram lindos presentes e enfeitaram tudo. Assim, prepararam a festa da solidariedade, do amor, da alegria. Cantaram, dançaram e foram aplaudidos de pé. Os “bonitos” serviam aos “feios” numa atitude de puro amor e dedicação. Era a festa do otimismo, da fraternidade. Era a festa da esperança, do afeto. Naquele momento, não existiam mais “feios” ou “bonitos”, todos estavam unidos. Agora eram irmãos, filhos de um só Deus. Agora eram amigos. Gente que se amava de verdade. Gente que se olhou e trocou alegria, amizade, vida. Era a festa Cristã, todos juntos, num só coração.
Bem...a parábola termina aqui. Talvez o leitor se pergunte: E onde está a moral da história? E eu respondo: A moral da história está na desconstrução do que se convencionou acreditar: Os jovens “bonitos” são indiferentes a tudo. Essa idéia é uma mentira. Diante da simplicidade, da pobreza, do infortúnio eles derramam lágrimas sinceras, molham o rosto e lavam a alma. Eles acreditam na vida, sim. Eles fazem acontecer. Seus olhos brilham quando se vêem capazes de oferecer sua mão amiga e fazer o outro feliz. Eles voam quando percebem o olhar de felicidade de uma criança maltratada pela sorte, desafortunada e sabem que aquele sorriso é resultado do seu amor, da sua capacidade de se dar sem querer nada em troca. Alguns até carregam idosos em suas cadeiras de rodas, impossibilitados, pelo tempo, com suas pernas enferrujadas e desusadas, para que tenham um dia feliz. Outros se impõem e se agigantam de repente, mostram-se líderes e, bem quietinhos, fazem acontecer. Organizam pratinhos de doces para os “feios”, arrumam, trazem enormes cestas com material para higiene e cuidam para que cada dança aconteça na hora exata e tudo transcorra de forma organizada. Há também os jovens que se escondem em suas palhaçadas alegres e dançam, brincam, roubam sorrisos dos “feios” que vêem neles a vida em cores.
Enquanto houver, então, quem acredite nesse potencial que a juventude tem de mudar a própria história e fazer acontecer, ainda haverá esperança, sim. Ter um novo coração. Fazê-lo bater no compasso da vida, mas sem perder a entonação, sem deixar que ele acelere muito. Mas com a atenção voltada para a dor que castiga tantos. Essas são pequenas questões a serem vistas e precisam ser plantadas nas gerações vindouras como sementes. As sementes da esperança de um mundo novo, capaz de acolher os que choram, sem perder a essência da alma e, assim, fazer que cada sorriso tenha sentido e que se possa olhar um através do outro, sem constrangimentos, sem se esconder, porque, quando a alma está limpa e a consciência tranqüila, o olhar brilha diferente e a gente pode se encarar sem constrangimentos, sem dissimulações.
Esta é a moral da história.