Era uma tarde abafada, e o sol se escondia lento atrás das nuvens escuras, como se estivesse hesitando em deixar o dia. Eu estava sentado em um banco de madeira desgastado no parque, observando as crianças brincarem e os pássaros voarem. O cheiro da grama cortada e do pão fresco das barracas próximas preenchia o ar. Era uma cena comum, mas havia algo de diferente naquele dia.

Enquanto eu pensava na vida e em todas as suas incertezas, uma figura apareceu à minha frente. Era uma mulher envolta em um vestido longo e escuro, que parecia absorver a luz ao seu redor. Sua presença era ao mesmo tempo intrigante e inquietante. O rosto dela era sereno, mas seus olhos tinham a profundidade de um abismo — um misto de sabedoria e tristeza.

"Posso me sentar?" ela perguntou, sua voz suave como a brisa que passava entre as folhas das árvores.

Eu acenei com a cabeça, intrigado. "Claro."

Ela se acomodou ao meu lado, observando as crianças correrem e rirem. "Você parece perdido em pensamentos", disse ela, com uma expressão desafiadora a lógica do momento.

"Sim," respondi, sentindo um frio na espinha. "Às vezes me pergunto sobre o que acontece depois que tudo isso acaba."

Ela sorriu , mas havia algo enigmático em seu olhar. "E o que você acha que acontece?"

"Não sei," confessei, lutando contra um nó na garganta. "Algumas pessoas acreditam em vida após a morte, outras acham que tudo termina aqui."

"E você?" Ela virou-se para mim com um olhar intenso.

"Eu… eu gostaria de acreditar que há algo mais," disse eu, tentando entender a razão daquela conversa tão profunda. "Mas também tenho medo do desconhecido."

A mulher inclinou-se ligeira para frente, como se estivesse compartilhando um segredo. "O medo é natural. A incerteza é uma parte da vida."

Senti meu coração acelerar enquanto ela falava. Uma parte de mim queria perguntar quem ela  era, mas a outra parte estava fascinada pela conversa.

"Você já perdeu alguém importante?" perguntei, curioso sobre sua perspectiva.

Ela olhou para o horizonte, onde as nuvens começavam a escurecer ainda mais. “Sim,” respondeu ela suave. “A perda é dolorosa, mas também é uma forma de amor.”

Um silêncio pesado pairou entre nós enquanto eu refletia sobre suas palavras. Comecei a perceber que aquela conversa não era apenas filosófica; havia uma sensação palpável de urgência no ar.

“Por que você está aqui?” questionei finalmente, sem conseguir esconder a inquietação na minha voz.

Ela hesitou por um momento antes de responder: “Às vezes é preciso lembrar que o tempo não é infinito.”

Senti um frio percorrer minha espinha como se uma sombra tivesse passado por mim. “O que você quer dizer com isso?”

“Eu venho para aqueles que precisam entender a fragilidade da vida.” Seus olhos penetraram os meus com uma intensidade quase hipnótica.

“Você está dizendo que… eu estou…” As palavras falharam em sair da minha boca.

“Estou aqui porque sua hora está próxima,” disse ela calmamente.

Um turbilhão de emoções tomou conta de mim: raiva, medo e uma estranha aceitação começaram a se misturar dentro de mim. “Mas eu ainda tenho tanto para fazer! Tantos sonhos para realizar!”

“E quantos desses sonhos você viveu?” Ela fez uma pausa, permitindo que suas palavras ecoassem na minha mente confusa.

“Eu… eu não sei,” murmurei, lutando contra as lágrimas que ameaçavam escapar. “Eu passei tanto tempo planejando o futuro que esqueci de viver o presente.”

Ela assentiu lentamente. “A vida é feita de momentos pequenos e preciosos; não deixe que eles escapem.”

Meu coração pesava enquanto entendia a profundidade do que ela estava dizendo. O clímax daquela conversa se tornava insuportável; eu queria lutar contra ela, contra essa verdade cruel.

“Posso escolher?” perguntei com desespero na voz.

“Você sempre pode escolher,” respondeu ela com ternura. “Mas lembre-se de que cada escolha tem suas consequências.”

Olhei ao meu redor — as crianças ainda brincavam despreocupadas enquanto o sol desaparecia  no horizonte. Eu queria gritar para todos aproveitarem cada instante como se fosse o último.

“Se eu tiver mais tempo…” comecei a dizer.

“Tempo não é garantido,” interrompeu ela . “Mas cada instante vivido com consciência é um presente.”

Naquele momento intenso e denso entre nós, percebi que ela não era apenas uma figura sombria; havia compaixão na sua essência misteriosa. E embora soubesse que meu destino estava selado naquele encontro casual no parque, algo dentro de mim começou a aceitar essa inevitabilidade.

“Eu entendo,” murmurei por fim, sentindo uma estranha paz tomar conta do meu ser.

Ela sorriu  — desta vez com um brilho nos olhos — como se soubesse o peso daquela aceitação. E então, assim como tinha chegado, ela se levantou e começou a se afastar lentamente.

"Viva bem," disse ela por cima do ombro antes de desaparecer nas sombras da tarde escura.

Fiquei ali sentado por mais alguns momentos, absorvendo tudo o que havia acontecido — sabendo agora que cada segundo era precioso e que viver plenamente era o verdadeiro desafio diante da Morte.

Ana Pujol
Enviado por Ana Pujol em 05/11/2024
Código do texto: T8189841
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