A CHIBATA E O OITO DE JANEIRO DE 2023.

O Brasil assistiu, incrédulo, aos atos golpistas no dia oito de janeiro de 2023. Idêntico ao que ocorreu no Capitólio, nos Estados Unidos, em que manifestantes pró Donald Trump, invadiram o símbolo da democracia americana, contrários aos resultados que elegeram Biden. Pediam a queda de Biden e a volta de Trump ao poder. O magnata assistia a tudo, de camarote e negava o incentivo a tais protestos. Como disse o Chacrinha, nada se cria, tudo se copia. Aqui, em terras tupiniquins, os manifestantes extremistas, pró Bolsonaro, decidiram fazer o mesmo. Como Trump, Bolsonaro está em Orlando, terra de magnatas, assistindo de camarote e negando incentivar tais atos, onde há pouquíssimo tempo, ele era o mandatário. Lá, só tomaram o Capitólio. Aqui, foram além, tomaram, vandalizaram e depredaram o Alvorada, o STF e o Congresso. A polícia inofensiva. O exército sem reação e comando numa apatia intrigante. O presidente preocupado com os estragos das chuvas em Araraquara. Lá, como cá, mais de mil presos. As imagens, vídeos nas redes, a identificação dos terroristas, a caça aos incentivadores e financiadores, os culpados por incitar um fato gravíssimo na história do Brasil. Como puderam fazer tudo aquilo, na sede do poder?! Tudo resultou em mais de mil audiências de custódia de presos em flagrante por participação nos atos que, foram sim, golpistas por tentarem tirar a força um presidente, eleito legitimamente nas urnas. Foram centenas de prisões decretadas. Muitos foram liberados mas terão que cumprir uma série de medidas cautelares, usar tornozeleiras eletrônicas, não usar as redes sociais onde destilaram seu ódio a democracia, cancelamento de passaportes, suspensão de portes e registros de posse de armas, entre outros. Mais grave ainda, esses invasores cometeram atos terroristas, enquanto se associaram criminosamente contra o Estado Democrático de Direito. Tentaram golpe de Estado, ameaçaram, perseguiram e incitaram o ódio, usando de violência contra os três poderes da República. Em 22 de novembro de 1910, dois mil e trezentos marujos dos principais navios de guerra da Marinha brasileira, se revoltaram pelo fim dos castigos físicos a tripulação, a grande maioria negros. Os oficiais eram todos brancos. Era a Revolta da Chibata. Vinte anos após a Lei Áurea de 1888, a mentalidade escravocrata ainda existia e marinheiros rebeldes eram punidos com 25 chicotadas, ou chibatadas. Era um código disciplinar. O líder da revolta era João Cândido Felisberto. Incentivados pela revolta só encouraçado Potenkim, na Rússia, em 1905, começaram a articular uma revolta no Brasil, contra o Estado. O presidente eleito era Hermes da Fonseca e a revolta estava marcada pra acontecer dez dias após sua posse mas o marinheiro Marcelino Rodrigues, do encouraçado Minas Gerais, foi condenado a receber 250 chibatadas, por ter ferido um cabo, que o acusara de roubo, com uma navalha. Marcelino cai, desmaiado pelos golpes mas as chibatadas continuam. Estoura a Revolta e os todos os navios são tomados na Baía da Guanabara. Seis oficiais mortos. Os canhões apontados pra sede do governo brasileiro, no Rio de Janeiro, o palácio do Catete , sede da República do Brasil na época, onde o presidente mora, está na mira. João Candido manda uma carta aí governo. Quer acabar com o fim dos castigos físicos, a melhoria da alimentação dos marujos e anistiar os revoltosos. Do contrário, o Rio de Janeiro será bombardeado sem piedade. As negociações começam. O povo em pânico. Dia 25 de novembro, o governo cede. O congresso aprova a anistia. Hermes da Fonseca aceita as reinvindicações, apesar da resistência dos oficiais da Marinha, disposta a guerrear contra os revoltosos. João Candido e os companheiros se entregam mas o governo não cumpre a palavra e prende-os. Seiscentos fuzileiros vão pra Ilha das Cobras, onde são bombardeados sem dó, morrendo quase todos. Duas dezenas deles, entre eles, João Candido, são presos. João Candido é internado num hospício. Muitos são levados aos trabalhos forçados na Amazônia, onde muitos foram mortos. João Candido, em 1912, foi absolvido de liderar a revolta porém foi expulso da Marinha. Virou pescador, vivendo na miséria. Ele morreu em 1969. A revolta da Chibata é um exemplo de como as questões sociais eram tratadas no início da República. Em comum, a tentativa de tirar do poder um presidente recém eleito. A diferença nos dois fatos é a forma de tratamento aos revoltosos. Na Chibata, os revoltosos, com uma causa legítima que era o fim dos castigos, foram enganados. Eles se renderam, crentes que o governo faria sua parte no acordo, mas foram perseguidos, presos, mortos numa clara evidência de opressão e preconceito. Os invasores de Brasília, a maioria brancos e até servidores públicos entre eles, com uma causa ilegítima, foram até escoltados, até a esplanada. Policiais tomam água de côco, filmam os invasores, incentivam e sorriem. Um quebra quebra generalizado nos palácios e sedes do poder. Uma senhora idosa defeca no palácio. Outro exibe o livro com a constituição. Vidros quebradas, extintores, relógios e obras de artes vandalizados. Imagens correndo o mundo, em tempo real. As camisas da seleção brasileira de futebol como sinal dos patriotas. Os revoltosos da Chibata eram descendentes de escravos. Eles usavam o branco da Marinha. Queriam apenas o fim dos castigos que traziam de volta os açoites das senzalas de uma escravidão recente . A revolta da Chibata acabou, ficou na história. FIM

marcos dias macedo
Enviado por marcos dias macedo em 20/01/2023
Reeditado em 20/01/2023
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