Pesadelo Acordado
As esperanças que nós temos no futuro são efêmeras, vagas, e eu não faço questão de buscar algo que valha a pena viver mais. Me recordo claramente da primeira vez que eu senti que a felicidade que eu sentia estava em cheque. Eu sonhei algo vivido. Um sonho intenso. Algo brilhante, alegre, pacifico e empolgante. Eu existia no momento. Eu fazia sentido. E você estava aqui.
Eu olhava para seus olhos e eles estavam vivos, cheios de alegria. Não me recordo bem o que conversávamos, mas, sentia-me empolgado, excitado, completamente voltado a você. O mundo era perfeito. Nosso beijo foi intenso. Você vestia um top de alcinha e uma saia plissada, e eu reparava no seu cabelo macio. No seu jeito. Seu olhar de garota inocente e perversa se fechando. Toquei meus lábios nos seus. Minhas mãos estavam no seu rosto, afastei um pouco meus lábios e tocamos novamente. Minhas mãos foram para a raiz dos seus cabelos, que puxei enquanto nosso beijo se tornava mais intenso. A música agradável completava com um ambiente onde estávamos a sós. Era somente eu e você numa escada vazia.
Após alguns momentos a sós, partíamos para o meio da multidão. Faz um tempo, sabe, que eu não experimento isto. Dezenas de pessoas no mesmo lugar. Caminhávamos alegremente para um momento embaraçoso, mas alegre, onde víamos pessoas que nós conhecíamos e que estimávamos. Pessoas que não vejo mais. Eu estava rodeado por tudo o que eu sempre quis. E então eu acordei.
A sensação de relaxamento dissipou-se imediatamente quando a pressão na região do plexo solar atingiu-me como uma marretada em cheio. Eu não sabia como, nem o porque, mas, eu carreguei durante o resto do dia um saco de ossos e carne chamado corpo.
Eu sei que você estava por aí. O mundo é estranho, confuso, mas, não posso me apegar a detalhes como o porque ou o que de mim e você não mantermos mais contato. Não fazia mais diferença. Desde o dia que terminamos, após um ano desgastado por sofrimento e incertezas, eu sei que não fazia mais sentido continuarmos juntos. Quero dizer, eu entrei em depressão profunda depois da última vez que nos encontramos. Estávamos diante da sua casa numa noite angustiante e eu e você tivemos nossa última discussão. Não fazia mais sentido um relacionamento se manter. Cada um foi para o seu lado. Nossos destinos não estavam previstos para se encontrar novamente depois de todo o desgaste emocional que eu sentia, principalmente depois que você tomava seu rumo, e eu ficava para trás. Solitário. Eu lutaria até o fim pela sua felicidade, mas, não havia muito mais o que lutar. Mágoa e rancor me corroía por dentro.
Ao ver dias negros e nebulosos, eu sabia que a cada dia mais eu me sentia menos presente na minha própria vida. Eu não me importava com nada.
Mas, ao sonhar com você aquela noite, uma estaca acertou meu peito. Nada de amor, nada de dor, apenas tudo do mesmo jeito, dia após dia, até meus ossos doerem e meus sonhos diluírem como água. O que eu sonhava mesmo? Não sei, não sonho mais.
A apatia apenas partiu momentaneamente quando as lágrimas vieram. Você estava internada? Estava morrendo? Minhas últimas palavras para você, quais foram mesmo? Não sei. Apenas me restaram a vontade de deixar flores em seu túmulo, e a espiral que eu estava descendo, sabe-se lá para onde.
Oito anos depois, e eu já te superei? Não sei. Mas, as noites de sonhos que refletem o oposto dos dias melancólicos que não combinam com o sorriso falso em meu rosto quando vejo pessoas conhecidas e finjo que eu estou feliz me fazem sentir mais desconectado do meu verdadeiro eu. Eu revi sua fotografia. E, após muitas semanas, senti algo. Vontade de chorar.
Sonhar com você foi o ponto determinante. Eu dormia para sonhar, e acordava para viver um pesadelo. Não quero mais acordar.