O homem que entrou no próprio corpo
Essa história se passa em qualquer lugar. Numa conversa de táxi, na página em branco do jornal, nos fundos do cinema ou livro velho jogado na estante.
Se deu pelo fato de ter entrado em mim mesmo. Num fluxo de memória. Em algum mantra. Na aula de yoga. No sono depois do almoço.
Era como estar perdido entre os olhos, boca, nariz. Descer pela garganta, ficar próximo ao coração e ver que cada batida daquela enormidade sangrenta e compulsoria, deixa-me vivo. Que delírio. Dava pra ver tudo. e, sentia também. Os pulmões pretos e escuros, cigarro é uma droga mesmo. Nem queira ver o fígado então, em tom de irônia. A sensação era totalmente estranha, o medo de ficar por ali batia. Não tão forte quanto coração, mas batia. Subo ao cerébro. Tudo compacto e extensivo. Engenhoso e bonito. Elogiava a mim mesmo. pensar que isso aqui me faz pensar.
Dava para ver tudo, que tal explorar.
Esôfago, intestino, rim, tripas, braços, pernas. Até lá eu passei. Lá. Lá mesmo. Isso. No peito, óbvio. Um passeio geral, me desbravei todo, literalmente. Sentia a pressa de algo sem tempo. Estava em estado de inconsciência, abri os olhos. Tudo era aquilo. pretendia acreditar que era sonho, mas não. Estava realmente ali. Passava a mão na pele, tocava, olhava, pulava e gritei. Sentia também vontade de chorar. não sei por que. nunca fui disso. Naquele instante, percebi três coisas: Quanto deus era maravilhoso, quanto a medicina era precisa e, quando iria embora. Antes de ir embora, e nem sabia como iria também. voltei aos olhos. Tentei entender a cor deles. Não cheguei a certeza precisa. Era preciso força pra ver, tudo castanho esverdeado mel. Insanidade total, era como mar de veneza nas tardes de quinta. Me aventurei por inteiro. Fiquei próximo ao ouvido. sentado. Cantando john lennon baixinho. Olhando tudo, aprensivo. Então, houve um soluço forte ou espirro. Era minha saída. acordei meio babando no travesseiro. com lapso, ou djavu, que seja. Peraí, tem alguém apertando a campainha: - já vaai, calma. Deve ser a malu.