Delegado Tobias
Este é um conto acerca do conto “Delegado Tobias”, de Ricardo Lísias.
O leitor, letrado como é, escolhera este curso sob o peso de ou querer virar poeta, ou professor — francamente, isso é tudo o que você precisa saber, leitor, para entender como dentre tantas obras que para ele eram de maior valor, Delegado Tobias passou a preencher suas horas. Você por acaso já leu Delegado Tobias? vol. 1 vol 2. vol. 3 vol. 4 e vol. 5? Ora, se há a opção de ter ou não lido, então pudera o leitor não ter lido a história pela qual se daria esta aqui, e que história a você haveria de se desenrolar então? A essa altura, consequentemente, questiona-se se não é, primeiro, papel do escritor ter a história para contar antes de se meter a escrevê-la?
De qualquer maneira, as manhãs em que o leitor dedicou algumas de suas horas para ler os primeiros quatro volumes foram um desastre. Talvez, assim, devesse você, o grande leitor que é, questionar-se se faria sentido uma experiência tão desgostosa como lhe foi ler Delegado Tobias àquelas manhãs, se tornar mais uma obra conturbada. “Há o peso do ofício.” pensam os leitores, e talvez o justifique. Como fosse pouco pertinente ao leitor questionar o sistema em que trabalha antes de fazê-lo funcionar, levantara-se antes mesmo que o sol. Condução após condução e o leitor que há de viver esta história liga menos que seus próprios leitores para ela. E depois de muita labuta, sentado em frente a um notebook com Delegado Tobias a sua frente, pedindo-lhe que o termine o quanto antes, deu-se à leitura.. Dito e feito. “‘O assassino do autor’ precisa significar algo”; o leitor, que ainda não se convenceu se estará prestes a ver algo incrível, bom ou mesmo lixo, quer que se tire algo de valioso deste título. Mas não tem pressa para começar de fato, e metido a eloquente, divaga; mais uma vez estão colocando em check a posição do autor. O leitor, acanhado, não se satisfaz, quer ler mais disto; E pois que, quando um leitor espera, inesperadamente o texto lhe dá. Muito bem, talvez devessem começar a questionar a posição da obra e não do autor, afinal o autor é só quem articula as palavras… e “o assassino do autor” bem poderia ser apenas uma história completamente divergente de toda essa razão que enseja com esmero e garrida acerca dos porquês que fazem as coisas serem o que são, e o papel delas à Arte, e apenas conta a história de algum Delegado Tobias que há de fazer alguma coisa com alguém e tudo isso nada é além de apenas um enredo que apenas se relação com o assassinato de algum autor. Simples: uma história. E assim começa a ler Delegado Tobias de verdade: mal passa a descer a rolagem do mouse, o leitor topa de cara com algo errado. Desceu e subiu o livro. Apenas frases, às vezes desarticuladas entre si, soltas. Facebook, Jornal; e os leitores, que não são bobos, certamente logo notam que se trata de um autor que de alguma maneira quer pensar em algo novo que diga alguma coisa pertinente. “Uma ova!” é apenas alguém que, sendo capaz de escrever algo de suposta competência, é também inteligente o suficiente para fazê-la se adequar a algo que o faria ser visto de outras maneiras, por outros olhos — o sucesso!
“A polícia não encontrou no local nenhuma arma, o que afastaria a hipótese de suicídio.” e ao ler isto, o leitor é interrompido por qualquer bobagem. Precisa se levantar, sempre há coisas mais importantes; e lima; e sua; ao retomar o título e reler o propósito desta história, assim, questiona-se: Em Delegado Tobias, o autor Ricardo Lísias ao escrever um livro que conta a morte do escritor Ricardo Lísias autor de Delegado Tobias diz nas primeiras linhas que pode não haver hipótese de suicídio, mas isso não é por si só um suicídio? Um dia vira moda, o suicídio é uma maneira que usam para serem lembrados… Só que este foi mais inteligente, não passou da ficção. O leitor está cansado, uma história chata sobre outra enfadonha. “Há o peso do ofício.” e continua a ler como no modo automático. Há cocaína, fala informal e cu, no meio de tudo isso, mas por quê? O leitor ainda não se convencera do que lia quando mais uma vez caiu-lhe a ficha. Lê sobre a explicação em relação ao pó, e continuam as tentativas do autor de provar que não se matou. Agora que o leitor já entendeu o ritmo da leitura, prossegue. “O assassino do autor.” o título já escancara que Ricardo Lísias é o assassino do autor, e não só possível assassino, porque ele se suicidou, e o autor, criminoso, só quer nos distanciar disto. “O Ricardo Lísias assassinado é o Ricardo Lísias autor de Delegado Tobias?”. O leitor, continuando a leitura, sente-se incomodado na cadeira onde, sentado, lê o discorrer daquilo que ainda não lhe é de valor. Você, leitor, está acomodado afinal? e um leitor divaga se faz sentido uma história escrita a uma tinta pesada e apressada por mãos trêmulas ser lida por olhos serenos, ingênuos. Quem precisa ser Ricardo Lísias para que este possa apenas criar uma história, sem que ela, apenas por imitar o real, se confunda com ele? “A modernidade é foda.” o leitor divaga.
Tendo concluído a narrativa do primeiro volume, o leitor esperava que houvesse sido tirado maior proveito do que até então havia sido lido, e está aborrecido que no ⅓ da obra que se pôs a ler (o peso do ofício), ainda não viu nada de muito especial. Ainda há o que ler, então “ufa!”, pode melhorar. “É competente o autor que leio, sei que é”, o leitor pensa, angustiado e presunçoso, e torna a leitura como quem primeiro tira a conclusão de que o autor é bom, e depois procura na obra algo que o justifique. Fica ao leitor a decisão, então, de se é ou não boa literatura a que é tratada aqui, e a prepotência inunda o coração do leitor que se sente, agora, tão importante à história quanto o ar que suas personagens respiram antes de cada aventura.
E este começa a ler o que diz respeito a “Delegado Tobias - volume 2” no mesmo instante, havia visto como era uma leitura rápida. Porém, logo após, tudo se apaga: a força caiu! Em plena hora de trabalho, e ao operário só restou esperar para que esta chance de prolongamento da tortura durasse o quanto menos fosse possível, ainda que facilitasse o trabalho, o que era bom para todos que trabalham. Enquanto a luz permanecia apagada, todos iam e vinham e a leitura foi adiada. “Como uma novela, posso abandonar e retomar a hora que me agradar que não perderei nada!” pensou o leitor… E quando tornou a ler, mais uma vez precisou parar a leitura.
Um documento de habeas-corpus aparentemente escaneado. O leitor lê, relê, e disso espera que virá grande coisa. Anseia, na verdade. Mas há apenas a incerteza… Ora, depois de tanta pretensão, informação, marca textual, estilo, firula, o que há neste Delegado Tobias no fim das contas? O leitor pensa, e ele passa a ter alguma coisa para daquilo dissertar. Era letrado, e assim questionara-se se Ricardo Lísias achava que seus leitores veriam naquilo realidade… questionara-se, o leitor, se ele os vê como bobos. E prosseguiu… A arte distorce a vida. Mas um conto? Delegado Tobias de Ricardo Lísias do romance Delegado Tobias de Ricardo Lísias é um conto, ou não há romance algum?
Bom, a essa altura do campeonato horas se passaram e o leitor já dera um tempo a leitura. Tendo chegado em sua casa algo em torno de 6pm, depois de mais labuta, leitores tomam um banho e vão se deitar… Um conto?
“Você deveria ter ido à aula àquela noite, idiota, você entenderia…” pensam os leitores que questionam o que poderia significar Ricardo Lísias enfatizar o fato de que aquilo é um conto… Mas o leitor, que tinha na indiferença, pressa, foi direto ao ponto:
“O conto é uma obra de ficção que cria um universo de seres, de fantasia ou acontecimentos. Como todos os textos de ficção, o conto apresenta um narrador, personagens, ponto de vista e enredo.” é a definição que o leitor acha com mais facilidade, e se satisfaz. A partir disto, deve-se dizer, é possível um novo ponto de vista para se entender a tudo. “Mas é uma maneira simplista”, pensa o leitor, “devemos questionar com austeridade essas fronteiras entre ficção e realidade”. E a literatura, enfim, não se altera. O leitor de Delegado Tobias, do curso, da Faber Castell, estava cansado. Dormiu um pesado sono e ao acordar na outra manhã, já foi à luta! Outra vez, tendo resolvido seus problemas na empresa, o leitor acredita que pode tornar à leitura para enfim terminá-la de vez. Ah, leitor, que está chegando ao fim de ⅔ da obra e passa a se sentir aliviado. Entende porque prefere eloquência, ela atrai; e ele acha, consequentemente, que esse tal de Delegado Tobias sequer deve existir, e o leitor, pobre coitado, não mais entende o que lê. É apenas um embaralhar dos limites que poderiam ser infinitos e cabem entre a verdade e a mentira, como dependesse apenas da vontade do autor. “Se ele pode, de maneira arbitrária, transformar em ficção o que é, antes, a realidade, por que não poderia ser feito o processo inverso, e transformar em realidade o que é, antes, nada senão ficção? E o leitor finalmente passa a ver, ao chegar nos “—” vazios de Delegado Tobias, uma maneira de entender o que ali discorre. O leitor vê, e sente na pele, a distorção entre pretérito e presente, “Era” e “é”; vê, ao ler os diálogos de Delegado Tobias, que eles mais pareciam ter sido construídos pelo que acontecia na história que lia o leitor, mas talvez antes foi tal diálogo, que já estava ali, o que suscitou o que, enfim, criou a história que lia. Pois que o leitor já está acanhado para entender o desfecho; não porque gostou da história, mas porque talvez não houvesse história alguma. “Desde quando o personagem não pode fazer literatura?”
O leitor finalmente entende, ou quase. Talvez precise de mais um tempo, nem terminara de ler, afinal. Sabendo que falta pouco, descobre a verdade de que ele mesmo descarrega significados incríveis a tantas e tantas palavras que um texto exprime, dando-lhe o valor correto, translato.. “O assassino do autor”: o leitor que acordara antes do sol, depois pegou a condução, e depois outra, e trabalho, “semana que vem eu viajo”; ávido leitor que àquele dia não conseguiu ler durante o trabalho o Delegado Tobias vol.3, para encerrar de vez, mas que se pôs a ler em outros momentos. Aque leitor que mais tinha para dizer que para calar.. Pouco problema, voltou para a casa e foi direto à tarefa.
E ao fim da leitura, o leitor parou e pensou, já no conforto de casa, tendo jantado um macarrão à carbonara e conversado com Pedro sobre futebol e a escola, no que havia lido. Entre o focar ao nada a pensar em significados e escrever qualquer coisa no teclado do computador, ainda olha de relance a televisão, onde o jornal está passando, e trata de coisa séria.
“Dê boa noite a seu pai, ele teve um dia cheio hoje.” o leitor ouve do outro quarto, enquanto ainda encara a tela do computador. “Você tem dez minutos para me pegar acordada, Luís” ouve falar a moça que apareceu na porta logo depois e riu; beija-lhe a testa e vai embora, tem sono, tal como ele, mas Luís precisava ali agora ser escritor, e há o peso…
Sempre lhe disseram que escrevia bem. “De que se trata, afinal e puta que o pariu, Delegado Tobias de Ricardo Lísias?” o leitor pergunta, já impaciente. E percebe que talvez não saiba a resposta. Poderia Luís nem ter lido, afinal, o conto a que se trata este conto. Mas se ele não leu, os leitores perguntam, como há aqui um conto sobre o conto que não leu? Ora, Delegado Tobias havia chegado ao fim e ele não tinha uma resposta para sobre o que se trata (e precisa se tratar de algo) este Diabo de conto. O leitor procura o vol. 4, desanima-se com a notícia de não achá-lo em palavras e desiste do vol. 5. A dúvida permanece, e a resposta nunca lhe chega. “De que se trata Delegado Tobias, afinal?” Haveria uma prova na faculdade, sentia que precisava saber… e é só isso? “O que ele quis dizer com tanto?” o leitor pensa profundamente, e, de repente, ávido leitor que é, simplesmente para de pensar; Homero não precisou armar o arco para contar sua Odisseia; é só um conto, o leitor pensa, Delegado Tobias é só um conto de Ricardo Lísias, uma história chata e escrita por um motivo perspicaz! E assim não é mais escritor, desliga o computador e escova seus dentes; deita-se e fecha os olhos, é tudo muito simples: Delegado Tobias é um conto de Ricardo Lísias! Sabendo disso, folga-se conturbado.
“O que estava lendo?”
“Delegado Tobias, de Ricardo Lísias. Um conto da faculdade.”
“Entendi..."
“Delegado Tobias.”
"Sim."
“É, sim… boa noite então.” e fecha seus olhos...
Mas já nem sabia o leitor o que e quem é esse tal de Delegado Tobias, bixo ruim, tampouco quem é, por Deus, esse tal Ricardo Lísias… e na realidade já nem sabia mais se não faria ele mesmo, desde o começo, desde quando folheara o título, parte de um conto qualquer onde apenas lhe é atribuído o valor de leitor mas que não consegue, aparentemente, entender nem um pouco de ficção… não sabe é de nada, bah, talvez sequer leitor ele seja.