A morte do guerreiro medieval
N.a. Este conto nasceu a partir de um sonho que tive há algumas noites. Segundo um amigo, pode tratar-se de uma lembrança de vidas passadas. Seja como for, é uma história que quero compartilhar com vocês.
"Ombros caídos. Semblante de dor. Cabeça recostada ao peito.
Os soldados que o arrastavam riam, apertando seus braços e voltando-os atrás. Ele não esboçava reação. Sua armadura estava incompleta, os cabelos negros caíam-lhe pelo rosto, suados, embaraçados, lama e poeira. O brasão em seu peito estava riscado, marcas da recente luta. Pelo chão onde passavam, vi corpos de centenas, milhares de soldados abatidos, guerreiros que entregaram suas vidas para defender sua pátria.
"-Ei-lo, Capitão."
"-Sir Allis Comport, finalmente terei a sua cabeça!"
Ele virou o rosto ao sentir a cusparada direcionada do capitão do exército até seu rosto ferido.
"-De joelhos!"
Vi-o contorcer o rosto de dor quando forçaram-lhe a ajoelhar-se diante do enorme homem de barba cinza e elmo, em cuja mão havia uma enorme lança que refletia sob a luz fraca do sol que se punha no horizonte. Grossos pingos de chuva desciam pesados sobre a terra, marcando aqui e ali os espaços.
"-Sir Allis Comport, fostes julgado perante a Corte e condenado à morte por traição e por proteger e acobertar a fuga de duas bruxas. Tens tu algo a declarar?"
Vi-o erguer a cabeça com dificuldade. O olhar gélido, firme. Vi o peito inflar-se, buscando ar e, num esforço sobrehumano, escarrar e cuspir sobre o brasão desenhado em Nanquim sobre a bandeira fincada ao lado do Capitão. Este, num gesto de fúria, o esbofeteia, enquanto os soldados erguem-no.
Num só golpe, o Capitão crava-lhe a lança em seu peito e a vejo perfurar e atravessar o corpo inerte que é solto e, após alguns segundos, tomba sobre a terra.
Minha boca se abre, mas nenhum ruído sai. Meus olhos de repente choram e meu peito se dilacera, enquanto vejo o olhar dele perder-se no meu e apagar-se num último suspiro."