CLARA DE LUA

Maria Clara rezava, rezava muito. Algum dia "seu príncipe encantado" lhe resgataria daquele castelo construído de dor, humilhação e lágrimas. Veja bem, não era um príncipe, era "o príncipe". O da vida real, não o do imaginário das noites e dias de tortura, onde as visões povoavam a sua mente.

Ele viria sem o seu cavalo branco, mas com suas vestes claras e traria, sim, o cheiro, o gosto de vida gostosa... Traria a leveza, o flutuar de sua mente no compasso certo, como as batidas do coração desse ser maravilhoso! Não precisaria ser perfeito, sabia isso ser impossível. Mas seria normal. Ah, como adorava essa palavra: normal, normal...

O seu conto de fada terminaria diferente, esta era a verdade que perseguia. Ele podia partir depois e até para sempre! Ah, mas a deixaria no "prumo".

Não era princesa, nem borralheira, apenas uma mulher de pólos enigmáticos, curvas sinuosas, raios, trovoadas e nuvens nebulosas...

O que a mantinha viva era o desejo de ter o poder sobre si mesma e passar despercebida na multidão...Que bom! E rezava, machucava os joelhos, penitenciava-se...mas tantas vezes perdera a batalha, curvando-se ao destino, feito João e Maria que encontrava a casa de doces no meio da floresta. E a velhinha boa se transformava na bruxa má prestes a devorar...

Ah! aqueles dias que entrava na "apetitosa casa" e não encontrava "seu príncipe" para salvá la. Mas a fome dentro dela roía, corroía e por final rasgava seu peito como um véu negro, de cima a baixo. Então depois da tristeza vinha o vazio, o pisar na atmosfera, sem dar por si.

Que mundo viajara, onde estava? Tudo rodando, as pernas de repente bambas. Comer muito, muitos "botõezinhos" brancos, acompanhado do "suco" amargo de um pequeno frasco que gotejava até passar aquela lua.

De repente a vida lhe parecia incrivelmente bela!Tinha muito trabalho e pouco tempo; muita arrumação sem conseguir terminar o que começava.

No pico do Himalaia se via a colocar esse ou aquele projeto em ação. Era preciso aproveitar a boa lua! Num instante estava na linha do Equador.

Assim se passavam os dias até que Maria Clara, finalmente, visualizava-se no espelho e, então, constatava mais uma vitória estampada em seu rosto. Ela estava viva! Vencera! E venceria também se tivesse um próximo quarto minguante, crescente, cheia...?

A sua mente ainda era um grande mistério! E ela fazia parte deste universo, onde, como ela, lutava para se manter... como dizer? Sóbria.

O seu príncipe? Ela aguardava e dizia que se chamava Hipócrates.