CONTOS DE NOVA IORQUE - 3/5 O FRONT
O vento fresco entrava pela janela do apartamento do nono andar. Ele estava sentado no sofá, saboreando um drink e assistindo “Meu Querido Companheiro”, não era a primeira vez que assistia o filme, já o assistiu algumas vezes, gostava mais dele que de “Philadelphia” e “Maurice”. O filme terminou, ele olhou para o relógio, desligou o dvd e a televisão. Foi até a cozinha lavar e guardar o copo e limpou a mesinha de centro, depois foi ao banheiro tomar um banho, logo sua visita chegaria e queria estar bem. Depois do banho esperou uma meia hora até que a visita chegou. Abriu a porta e o viu depois de tanto tempo.
- Entre, eu estava ansioso, pensei que não fosse verdade, nem acreditei que você estava de volta, seja bem vindo. – Disse ele não contendo a emoção.
- Obrigado, tive que tomar coragem de vir te ver, não sou mais o mesmo, você pode notar.
- É sim, é o mesmo, nada mudou, não para mim.
- Mudou.
- Esse lar ainda é seu também, como antes o era, você sabe.
- Não sou mais o mesmo, só metade.
- Eu senti tanto a sua falta.
- Eu também senti sua falta, mas fiz minha escolha.
- Quer um drink?
- Quero sim.
Ele foi ao barzinho no canto da sala e preparou os drinks, no barzinho já tinha tudo que precisava.
- Daiquiri, como nos velhos tempos.
- Que bom que você lembrou.
- Eu nunca esqueci o que fomos um para o outro.
- Nem eu, apesar de ter estado tão longe, mas o futuro é outro.
Ele sentou no sofá e olhou o amigo.
- Meu Deus! – Disse.
- O que foi?
- Eu já ia dizer pra você sentar no sofá, me perdoe.
- Tudo bem, eu me acostumei, não preciso mais de sofá, na verdade eu queria muito ficar em pé, rsrs.
- A tempestade no deserto foi difícil pra você.
- Foi, mas eu iria novamente, eu acredito no que fazia.
- Há quanto tempo está de volta?
- Há algum tempo, como eu disse, tive que tomar coragem de vir te ver, por estar assim, mas está semana vou embora.
- Não desapareça de novo, minha casa é sua casa.
- Eu estava esquecendo, trouxe lembrança pra você.
O amigo tirou um pacote da mochila e o entregou. Ele abriu o pacote.
- Um filme do Abel Ferrara, e um dos primeiros, eu adoro Abel Ferrara.
- Veja o outro.
- Um dos Gus Van Sant, também dos primeiros, sou louco por Gus Van Sant. Estou tão feliz. – Disse ele segurando as mãos do agora amigo.
- Que bom que você gostou.
- Minha irmã viajou ao Rio de Janeiro, tem uns dois anos, trouxe um livro de poesias, guardei pra você, eu sabia que você um dia iria aparecer.
Ele se levantou e foi até a estante, pegou um livro e sentou perto do outro.
- É de um poeta brasileiro, um poeta que fala de liberdade, de igualdade social, Fabiano Soares da Silva. Tem um poema que gosto muito. – Disse ele entregando o livro ao amigo.
- Estou muito feliz hoje, como há muito não me sinto. Agora leia o poema que gosta, depois pego o livro.
- “PEQUENO MANUAL DE TAQUIGRAFIA”
Do livro “Pequeno Livro de Poemas”
Abro a janela
Como que se afoga
Tentando se livrar
Das águas que adentram as narinas
Hora estou aqui
Hora estou a meia hora
Partindo-a ao meio
Como limões azedos
Não consigo fazer uma canção
Mesmo assim sigo cantando
Ando a passos largos
Sem saber onde ficar
Meu único lugar é em mim.
- Que poema lindo, eu prometo que vou ler o livro com carinho. Disse o amigo
- Quer ver um filme, ouvir uma música, enquanto tomamos outro drink, como antigamente?
- Um filme, você escolhe. – Escolheu o amigo.
Ele se levantou, foi novamente até a estante e pegou um filme.
- Que tal “Carrington”?
- Sim, vai ser muito bom rever. Só não quero ver mais filmes como “Franco Atirador”, “Alucinações do Passado” e “Zona Verde”. Filmes assim me trazem lembranças, não me sinto bem com eles.
Arnoldo Pimentel