MORTE SÚBITA - PARTE II


Depois de muitos saltos pelo caminho, Oiapoque e Chuí chegaram às margens de uma belíssima praia fluvial, rodeada por extensas paisagens. 
Oiapoque tirou o celular do bolso e verificou a hora. Acionou o GPS para se localizar: "Desculpe, estamos sem conexão no momento, tente mais tarde" ('Droga! Preciso mudar de operadora urgente.'). Adepto das artes marciais desde os primeiros saltos; seguiu o ritual que compõe a evolução técnica de cada lutador, chegou a graduação de faixa preta de Kung Fu. Lembrou-se das palavras do mestre para manter-se firme:
_"Pequeno sifonáptero (pequena pulga), livre-se da tristeza, os dias que se foram são como as águas do rio que passam. O que foi não será; sementes novas brotarão no caminho".(Mestre: Pul Gao Chin). Oiapoque, manteve o silêncio dos sábios contemplando o rio iluminado pelos raios da lua cheia...
 
 
A noite estava fria... Chuí percebendo o amigo calado, acendeu uma fogueira e também aqueceu a água que tinha colhido do rio na caneca. Com a cuia na mão preparou o mate. Lembrou-se das rodas de mate no sul com os amigos, dos shows que sua banda de música regional fazia...Descartando é claro, o infeliz episódio do seu produtor musical transando com a sua pulga amada. Foi traído de uma forma inexplicável. Merecer não é a palavra que define o fato. Enfim, era mais um corno tentando recomeçar. Agora, sonhar com o impossível era o primeiro passo para torná-lo possível. Um compositor nato que encontrou um amigo que tinha o mesmo propósito. Os dois seguiriam para Goiás para formarem uma dupla sertaneja. Na sua plenitude, era fundamental seguir adiante, não podia desistir da vida agora sem arriscar o seu sonho. Nem ofereceu o chimarrão ao amigo, vendo que ele estava envolvido nos próprios pensamentos, quando de repente, viu uma onça pintada, logo atrás a raposa.
 
 
Os dois percebendo o perigo que corriam apagaram rapidamente a fogueira e ficaram observando o movimento felino e a fala mansa da raposa:
 
_...Já sei, já sei, amiga:  "tá na hora da onça beber água..." 
_ Porque fala assim, sabe que eu odeio estereótipos. Depois de um dia tenso em que fui caçada à tiros. É justo matar a minha sede, descansar. Surpresa a raposa perguntou:
_  Foi caçada? Não entendi, não ouvi nada... ah, acho que na hora estava na minha toca curtindo o som do Iron Maiden no fone de ouvido...
 
_ Sempre assim, você e as suas tecnologias, quando precisa estou sempre pronta a ajudá-la. Agora quando eu preciso...bela amiga eu tenho!
  
 Cabisbaixa a raposa consentiu:
_ Desculpa, foi mal. Não imaginei um ataque por causa da sua pele. Ninguém nos respeita, somos pobres animais sobreviventes em extinção...
Correr pra onde, se o nosso espaço está sendo cerceado. Nossos limites sendo impostos, a alma das matas sendo aniquilada pelas queimadas...
A onça levantou os olhos curiosa pelas palavras da raposa e rebateu:
_Nossa amiga, você se filiou ao Greenpeace? Daqui à pouco vai querer fazer protestos nas convenções da ONU...se envolvendo em questões relacionadas à preservação do meio ambiente, desenvolvimento sustentável, ecossistema, preservação das florestas, energia nuclear...
 
 
Oiapoque e Chuí estavam atentos à conversa das duas feras, ao mesmo tempo prevendo a possibilidade de uma carona, dependendo do rumo que elas tomassem depois da conversa. Com a droga do GPS do celular fora da área de cobertura. Oiapoque usaria a técnica de orientação pelas estrelas. Fez sinal para Chuí, ficando atentos para o provável salto. Aproximaram-se despercebidas como ninjas. Foram surpreendidas, com o estalido ensurdecedor, era tiro...arriscando, saltaram na amiga da onça. A raposa saiu em disparada no sentido oposto ao que a onça correu...
 
Mais uma aventura que as duas pulgas experimentaram, agarrando-se com dificuldade sentiram a correria e a revolta da raposa, que deixou tudo para trás. A onça refugiou-se no meio da mata sem dar qualquer sinal. Como aqueles que se ausentam e não postam mais nada no Facebook.
Nunca mais foi vista pelos lados da floresta, boatos circularam na internet que ela havia sido ferida na pata, traumatizada, morreu de depressão. Na verdade, a onça foi encontrada por uma fazendeira da região. Socorrida e salva,
demonstrando mansidão e brandura,  foi  adotada como animal de estimação. Recebendo todo o apoio e carinho que sempre sonhou, mesmo sendo um animal selvagem (Ainda existem pessoas boas.).
 
A raposa rumou para o oeste correndo sem parar até o quanto pode, perdendo o fôlego, fraca, desorientada. Com a visão fraca ( era míope acoitada), caiu no precipício e com a queda veio à óbito. Oiapoque saltou antes chamando o amigo. Chuí amedrontado pela queda só teve tempo de dizer " Bah! Que barbaridade, tchê!" Seu corpo caído de um lado e a cuia de chimarrão do outro. O coração não resistiu ao susto, Teve morte súbita. Não bastou o susto quando flagrou seu produtor musical possuindo a sua amada. Seu sonho de cantor sertanejo se perdeu para sempre.
 
 
Triste, depois de enterrar o amigo. Sabendo que a vida é um corredor, a morte apenas uma porta, Oiapoque voltou-se na direção do oriente lembrando dos ensinamentos: "Pequena pulga, se você está deprimido, está vivendo o passado, se você está ansioso está vivendo o futuro, se está em paz, está vivendo o presente..." Mas no seu pensamento tinha uma pergunta que não queria se calar: "Grande mestre, Pul Gao Chin, ( o amado mestre não me esclareceu essa parte direito) E se eu não estiver nem deprimido, nem ansioso e sem paz?
 
 
Oiapoque meditando, ouviu uma voz que veio do seu interior:
 
"Aí pequena pulga, nesse caso...bem...vejamos... é melhor tu consultar o Google, e quer saber... vai te catar ow..."
 
  
Alberto SL
Enviado por Alberto SL em 07/07/2013
Reeditado em 01/06/2014
Código do texto: T4375739
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