O maldito Deron

Logo que saiu da barriga da mãe, junto com uma porção de ar, tragada pela narina, Deron também recebeu uma maldição, então ele chorou. Não sabia por quem, nem o porquê fora amaldiçoado, mas assim que o ar tocou as paredes dos seus pulmões, o menino teve certeza.

Fez do seu primeiro choro o último.

Cresceu certo da ciência pública de sua maldição, todos e todas o olhavam como se olha um condenado, sentia-se um verme a rastejar nas cabeças dos que o observavam. Era réu diante das palavras dos que se aproximavam, refém de sua própria sina, não acreditou em nada do que ouviu, cresceu sem acreditar, pois até a verdade posta sob sua consciência se daria por engano ante sua maldição.

Há de fato dolo, ou mesmo culpa? Nunca soube, nunca entendeu.

Deron pouco soube, ou nada, mesmo. Mas leu em todos os rostos uma carta, muito clara. Uma carta com um poema. Em cada rosto um verso, em cada verso o mesmo veredito: Deron é maldito.

Apesar de julgar não dominar a arte de poetizar no rosto, como todas as pessoas conhecidas, ele escreveu na sua própria fronte o seu haikai, era uma página em branco tão sutil, dizia com a ausência de palavras o que seu autor sentiu com a presença delas.

Com uma corda forte Deron fez um laço ao redor da maldição, sem vacilar pendurou tudo, os olhares que o corroíam, as palavras que faziam calar, as verdades que não se faziam fatos. Pendurada a maldição, pôde se sentir o êxtase único do alma que descola da carne como a maldição que descola da porção de ar, então murcho e impotente restou a Deron a projeção do vazio na calma e fúnebre liberdade.