Fugaz

O vento balança as árvores e o meu coração. Junto com ele, lembranças chegam e dominam a minha mente. Dores, alegria. Vejo uma menina sorrindo e, de repente, sou essa menina. Ela corre, brinca, abraça alguém. A cada passo dela, uma lágrima escorre de meus olhos. Ela me olha e sorri. Seu sorriso bagunça a minha alma. “Onde perdi essa forma de sorrir?”, pergunto a mim mesma. Ela estica sua mãozinha e toca em meu rosto. Nossos olhares se cruzam e eu me vejo em mim.

- Não cresça! – peço a ela, que sorri.

- Eu sou você, e você já cresceu. – ela responde, ainda sorrindo.

- Não, não. Conserve a sua pureza. Mantenha-se afastada das dores, pequena.

- Você já sentiu todas as dores por mim. Você já viveu por mim, com todas as perdas e alegrias. – e, de repente, ela corre e abraça outra pessoa. Era uma mulher. Meu coração congela e lágrimas deslizam pelo meu rosto. Era ela. “Mas como pode?”. Olho a minha volta e não sei se vivo um sonho ou se vejo a realidade.

Na ânsia de entender, sento e observo as duas. Elas brincam, riem. Estão tão felizes! “Quando estivemos assim? Quando fomos tão felizes?”, penso, e continuo a observar. Elas cantam e, quando percebo, estou sorrindo. O meu olhar se cruza com o da mulher, e ela vem em minha direção, sorrindo, livre de todas as coisas que a angustiavam. Ela se senta e me olha. Seus olhos são expressivos e, repentinamente, entendo tudo o que se passa em seu coração. A saudade me domina e, quando vejo, sou uma criança nos braços dela. Ela me ampara, me abraça e me beija, como fazia quando eu era pequena. Tenho tantas coisas para dizer, tantas novidades para contar, mas prefiro ficar em silêncio, recebendo seu carinho.

- Como você está? – pergunta a mim. Olho em seus olhos úmidos e sorrio.

- Nesse momento, eu estou bem. Estou plena. Senti tanto a sua falta!

- Eu também, florzinha. Queria tanto ter estado com você durante esse tempo. – ela confessa, e vejo uma lágrima que rola de seu rosto.

- Precisei tanto de você! Desejei, durante todos os dias, te contar cada passo de minha trajetória. Queria te falar o que tenho feito, os rumos da minha vida. Perguntei a você o que achou do meu corte de cabelo, das minhas novas escolhas, do meu novo jeito, mas você nunca respondeu. E tenho perguntado ao destino o porquê de todas essas coisas. Não é justo ele ter tirado você de mim. Eu continuo precisando de você! – e me sinto criança mais uma vez, desamparada e aflita, sem alguém para me estender a mão e me mostrar a luz do dia.

Então a olho, desejando respostas que ela não poderia dar. Noto desamparo em seus olhos. A ansiedade entre nós é enorme, mas não havia forma de aliviá-la.

- Desculpe. – ela responde, e sinto uma pontada em meu peito. – Eu queria estar por perto. Minha vontade era te ver crescer. Sempre me perguntei como seria aquela garotinha esperta quando crescesse. Todos os dias, ao te olhar, pensava em quem você iria se transformar, em qual profissão você seguiria, mas não tive tempo para que meus questionamentos fossem respondidos. – um misto de dor e alegria transparece em seu rosto. Ela sorri e, simultaneamente, lágrimas escorrem. Mais uma vez, abraço-a e desejo ficar ali para sempre, presa a algum lugar que não conheço.

- Sei que você pode não estar comigo diariamente, mas acredito que me acompanha de onde estiver. Desejo um dia te encontrar e aguardo ansiosamente pela chegada desse momento.

Ela sorri e me abraça. Estamos bem, felizes. Um silêncio amigo nos envolve e deito em seu colo.

Ao longe, vejo a menininha acenar com a mão, despedindo-se. Ela sorri e corre para lugar nenhum.

O despertador toca. Levanto assustada, pensando no que acabara de acontecer. Sensações invadem minha alma. Tudo está vivo em minha memória. Em algum lugar, estivemos mais uma vez juntas. Após refletir, percebo que algo faltou: eu me esqueci de dizer o quanto a amo e a amarei até o último dia de minha existência.

- Eu te amo! – grito, angustiada, desejando ouvir sua voz pela última vez.

Paula Vigneron
Enviado por Paula Vigneron em 23/06/2012
Reeditado em 25/07/2012
Código do texto: T3740632
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