A UM PASSO DO CÉU
Clovis havia chegado do trabalho, já era tarde, passava das dez da noite, tomou um banho e se preparava para deitar. Estava muito cansado, tinha trabalhado pesado. Morava no sitio e trabalhava na cidade que ficava a alguns quilômetros dali. Os últimos dias não tinham sido muito bons para ele, passava o tempo vago perdido em seus pensamentos. Estava sozinho, a mulher e a filha tinham ido passear na casa da sogra, fazia uma semana que elas viajaram. Fazia tempos que sua esposa não via a mãe e aproveitando as férias da moça a levou para passar uns dias com a avó.
A mãe da esposa de Clovis morava numa cidade a uma hora de viagem, no mesmo local moravam também os pais dele.
Clovis escutou um chamado lá fora, alguém chamava por seu nome. Vestiu uma camisa e foi atender. Quando abriu a porta viu um senhor de uns sessenta anos, pessoa humilde, pela aparência.
O homem se apresentou como sendo seu Durval um velho amigo de seu pai, disse que estivera com seu Jerônimo pai de Clovis a dois dias atrás, contou que o mesmo dissera que se o viajante passasse na casa do filho este o acolheria, e que por isto estava ali. Explicou que iria embora logo que amanhecesse.
Clovis reconheceu o tal senhor, quando era jovem já o tinha visto na casa de seu pai, lembrou-se que realmente eram amigos. Mesmo com toda certeza que o homem estava mentindo, visto que seu pai morrera quinze anos atrás, resolveu não render assunto, deixando que o homem pensasse que havia acreditado, não iria negar hospitalidade a um conhecido da família ainda mais àquela hora da noite, o homem não conhecia mais ninguém por aquelas bandas, sem contar que o vizinho mais próximo morava a uns três quilômetros.
Fingindo ter acreditado Clovis mudou de assunto, ofereceu ao visitante um banho, depois serviu-lhe o jantar, e rapidamente arrumou a cama onde o hospede descansaria.
Antes de deitar-se o homem agradeceu a atenção e a estadia. Clovis apressou-se em deitar também, estava demasiadamente cansado, além do mais não queria render conversa, a morte do pai era recente e ele o amava muito, eram muito unidos.
Só uma coisa os diferenciavam, seu pai era um homem que acreditava muito em Deus, católico à moda antiga,e não se sabe porque Clovis tornou-se cético, acreditava meramente na força do trabalho e que a morte era o fim de tudo. O pai sempre tentando convertê-lo mas nada pôde fazer, era essa a única coisa que deixava o velho triste em relação à família.
Pela manhã, quando Clovis levantou-se o homem tinha ido embora.
Sobre a mesa estava um pingente de Nossa Senhora Aparecida, Clovis reconheceu ser o mesmo que sua filha tinha recebido de presente do avô em um dia doze de outubro, quando ela era ainda criança. A filha devia tê-lo esquecido ali.
No dia seguinte quando a mulher e a filha chegaram de viagem Clovis comentou que ela havia esquecido o pingente em cima da mesa, a filha vendo o pingente disse ao pai que devia ser um parecido, o dela não poderia ser, pois quando no velório do avô ela havia colocado o pingente no bolso do finado, como prova de carinho, o que a mãe confirmou, pois a filha tinha lhe contado isso logo no dia seguinte da morte do velho.
Nisso Clovis lembrou-se do visitante e fez menção de contar à esposa, mas quando disse:
_Elza, lembra do Sr. Durval, aquele velho amigo do meu pai...
A mulher rapidamente completou:
_ Foi enterrado a quatro dias! Fui ao velório, morreu de ataque cardíaco.
Clovis permaneceu em silêncio.
Saulo Campos
Itabira MG