ESTÓRIAS DOS QUATRO VENTOS: O ESPANTO ADULTERINO

ESTÓRIAS DOS QUATRO VENTOS: O ESPANTO ADULTERINO

Rangel Alves da Costa*

Conto o que me contaram...

Dizem que num lugar bem distante, lugarejo pacífico onde vivia um povo tradicionalmente conservador, respeitador demais das famílias e das relações sociais, descobriram a existência de uma ovelha negra.

Ora, ovelha negra porque ali jamais se comentou, pensou que existisse ou asseverasse que em meios às senhoras honradas e pudicas houvesse uma mulher adúltera, safada, que chafurdasse além dos limites do seu leito conjugal. Mas havia sim, e quando surgiram as primeiras conversas foi um deus-nos-acuda.

Tudo começou com uma cartinha que traiu a sua destinatária e caiu, sabe-se lá como, das entranhas de um esconderijo qualquer e ficou lá estendidinha no piso da igreja, até que a beata mais beata que existia, daquelas ao mesmo tempo timidamente fofoqueiras e de alma já entregue aos santos, a avistasse e lançasse sua mãozinha sobe ela.

Pegou o bilhetinho, abriu-o cuidadosamente, levou até o olhar e o espanto enrubescedor prontamente se fez:

“Meu docinho de coco, meu taquinho de mamão com mel, um beijo na boca e uma mão escorregando pelas partes mais deliciosamente quentes. Que saudade danada minha danadinha cheirosa. Será que seu marido, aquele corno contente, vai deixar hoje um tempinho pra gente se encontrar lá naquele escondidinho de sempre? Do jeito que estou apaixonado, logo vou pedir sua mão em casamento e você vai ter de escolher se fica comigo ou continua com aquele imprestável de seu marido. Ontem vi você entrando na igreja com suas outras amigas, e estava linda, mesmo que em meio àquelas velhas corocas desavergonhadas e que se fingem de santas para fazer o bem-bom nos escondidos. Não tem nenhuma santa. É tudo igual a você, safada. Só que você é minha safadinha. Um beijo lambido. E não esqueça, na mesma hora e no mesmo lugar. Seu amante apaixonado”.

Após a leitura, toda exasperada e com indescritíveis cor e semblante, a velha beata caiu desmaiada feito um fardo de algodão. Buff! Ao acorrerem para ver o que tinha acontecido, logo perceberam na mão o motivo daquele piripaqui, daquele desassossego corporal.

Na curiosa leitura passada de olho a olho, mais cinco desmaiaram e duas ficaram totalmente mudas. Fora as outras que deram pra se mijar, soltar gritinhos histéricos, babar pelos cantos da boca. Foi quando o velho sacerdote chegou, se benzeu mais de três vezes ao ler a adulterina missiva, porém resolveu tomar drásticas providências e disse que ia fazer a leitura do bilhetinho desavergonhado em plena missa.

E disse ainda que já tinha grandes suspeitas sobre quem aquele papel safado havia sido endereçado. E também ia dizer o nome. Só que na missa a igreja estava completamente vazia.

Poeta e cronista

e-mail: rangel_adv1@hotmail.com

blograngel-sertao.blogspot.com