Super-Herói

- Voe filho, voe!

“Estou voando Papai”

- Corra filho, corra!

“Estou correndo Papai”

- Lute filho, lute!

“Estou lutando Papai”

Foi assim que papai me ensinou como ser um aviador. Morávamos papai e eu em uma pequena casa, que ficava num lugar rodeado de montanhas. Mamãe faleceu assim que eu nasci, deu a vida dela pela minha. Papai era o “Comandante Paul” lá no batalhão da aeronáutica; pra mim, ele se tornou o “Super-Pai” – o maior herói de todos os tempos- quando eu descobri quem ele era.

Eu sempre quis voar, mas ele dizia que um garoto com nove anos de idade não pode tomar conta de um avião sozinho.

Quando papai estava pilotando qualquer avião era a coisa mais legal do mundo. Ele pilotava caças e fazia piruetas pra me impressionar. Ninguém era tão bom quanto ele.

Sozinho em casa, eu costumava ler quadrinhos dos meus heróis favoritos, e o Super-Homem era o meu ídolo. Às vezes queria que papai tivesse poderes como os dele, mas eu sabia que isso era impossível.

Ao chegar a casa, antes do pôr-do-sol, papai me levava até um velho depósito e lá começávamos a montar seu avião. Era um novo projeto dele. Assim que estivesse pronto, papai havia prometido que eu poderia o pilotar.

Eu fiquei doente por certo tempo, então papai estava montando seu avião sem a minha ajuda. Ele dizia que se eu ficasse bom logo, o avião já estaria pronto para mim, só pra mim. Quando a asma atacava, fazia com que eu ficasse sem ar (eu pensava que ia morrer), mas papai sempre estava lá com remédios ou só com sua presença, e isso, já bastava.

Depois de algumas semanas na cama, eu já estava bom pra correr, brincar e pular. Papai tinha chego tarde em casa e nem teve tempo pra ver seu avião. Ele começou a fazer o jantar e enquanto ele o fazia, eu sentei na cadeira defronte a mesa e fiquei esperando.

- O jantar está pronto Matthew. Lavou as mãos?

- Sim senhor.

- Certo. Pegue dois pratos e os talheres, coloque-os na mesa.

Fiz o que papai mandou e começamos a comer. Eu queria perguntar várias coisas a ele, mas não sentia que devia. Era estranho porque eu sempre falava demais na hora do jantar, ele ia perguntar o por quê desse silêncio. O titilar dos talheres era o único barulho que se ouvia ali, então eu não agüentei.

- Papai... Posso perguntar uma coisa?

- Pensei que alguém tivesse cortado sua língua. – começou a rir e eu também. – Pode perguntar filho, qualquer coisa.

- É que faz tempo que eu fiquei lá na cama e eu pensei que o senhor já tivesse terminado de construir meu avião.

- E onde está a pergunta? – deu um belo sorriso.

- Bom, eu quero saber se eu já posso voar nele. Posso?

- Hum... Deixe-me ver. – fez uma cara pensativa muito engraçada, comecei a rir alto. – Pode. Amanhã quando eu chegar do trabalho deixo que você voe.

Meus olhos estavam brilhando e eu senti uma alegria enorme dentro de mim.

- Obrigado papai. – terminei rapidamente de comer, pedi licença e dei um beijo em seu rosto.

Quando estava indo pro meu quarto, ouvi a voz dele e parei de andar.

- Filho. Eu sei que você quer muito voar, mas isso não é brincadeira ta? Todo cuidado é pouco, não chegue perto daquele avião sem que eu esteja com você. Entendeu?

- Sim papai, entendi.

Retomei minha caminhada para chegar até meu quarto e lá conversei com meu boneco do super-homem. “Eu irei voar, vou chegar mais alto que papai e você juntos, serei um herói!”

Coloquei meu pijama e fui escovar meus dentes. Depois disso deitei na minha cama e abracei meu boneco. Papai entrou no quarto, colocou um cobertor sobre mim e, com um beijo na minha testa, desejou-me boa noite.

Lá estava eu voando, papai estava voando também; ele era tão forte que parecia o Super-Homem. Meu pai era um super-herói, todos morreriam de inveja por eu ter um pai igual o super-homem. Estava sonhando.

A porta da sala fez um barulho enorme quando papai saiu pra trabalhar e então eu acordei. Comi o que ele deixou preparado pra mim e fui andar um pouco lá fora. O sol estava radiante e eu sorri ao ver aquela luz magnífica sobre mim. Fui até o velho depósito e sob um pano grande e velho, estava meu avião.

Retirei o pano que o cobria e vi como ele era bonito. Pequeno, mas era perfeito pra mim. Papai tinha pintado-o com as cores que eu mais gostava: azul e branco. Passei a mão sobre aquela coisa maravilhosa e segurei a vontade de pilotá-lo naquele momento.

Voltei pra casa e peguei minhas revistas em quadrinhos. Fiquei no depósito a tarde toda os lendo. Num capítulo, o super-homem tinha aprendido a voar sozinho. Então soltei as revistas e subi no avião.

Segurei o manche do monomotor e tentei me lembrar de como papai fazia aquilo. O barulho do motor era alto e forte, e então, eu estava saindo do depósito com ele.

O avião permanecia no chão, mas a velocidade era imensa. Tudo chacoalhava muito e, então, vi papai correndo na minha direção. Ele estava do meu lado e eu não conseguia frear.

- PARE O AVIÃO MATTHEW!

- Eu estou voando papai, estou voando!

Sim, eu estava voando. Já estava fora do chão e começava a ganhar mais altura. Eu sentia um frio na barriga, estava com medo, mas a adrenalina era maior que tudo. Lá em baixo, meu pai ainda estava correndo; percebi que ele estava indo em direção às montanhas e cachoeiras. Depois de certo tempo, cheguei a um ponto de não saber mais pra onde ir com o avião e, então, vi uma enorme cachoeira bem na minha frente, eu subi o máximo que pude. Ao chegar ao topo, eu perdi o controle e bati numa enorme árvore que tinha lá em cima. Não sei como, mas papai estava lá.

Minha cabeça estava doendo muito, acertei um tronco com ela. Papai tentava me tirar do avião e eu estava meio tonto. Tirou-me de lá e pude ver que ele estava com um pára-quedas. Percebemos que o céu estava escuro e as primeiras gotas da chuva começaram a cair.

Papai agachou-se na minha frente e olhou-me nos olhos.

- Matthew, não posso descer a cachoeira andando, o barro vai fazer com que a gente caia. Você vai ficar preso a mim. Só tenho esse pára-quedas, então vou prendê-lo aqui na minha frente.

Eu queria fechar meus olhos e dormir, mas papai dizia que eu devia me manter acordado. Ele estava me prendendo junto a ele.

Foi até a beira da onde estávamos e começou a falar.

- Lembra quando o papai dizia pra você como era ser um aviador?

- Sim papai.

- Então se mantenha acordado, porque agora você vai voar. – eu seria um herói. -Um, dois, três!

Papai pulou do alto da cachoeira. Ele abriu o pára-quedas e controlava-o. Por um instante ele me deixou controlar tudo.

- Voe filho, voe!

- Estou voando papai!

Chegamos ao chão e ríamos como bobos. Papai soltou a mim e o pára-quedas, vimos que estávamos longe de casa, muito longe.

- Falta pouco pra você se tornar um herói Matthew!

A chuva estava aumentando. Os raios e trovões já me assustavam.

- Corra filho, corra!

- Estou correndo papai!

Corremos o máximo que conseguimos. Minhas pernas eram pequenas, então várias vezes papai voltava e esperava até que eu conseguisse correr novamente.

Quando avistamos nossa casa, papai me pegou no colo e começou me apertar. Eu estava rindo e ele também. Colocando-me no chão ele dizia:

- Lute filho, Lute!

- Estou lutando papai!

E assim, eu e ele travamos uma briga feia. Era uma batalha de abraços, carinhos e risos. Papai me tomou nos braços e ergue-me em direção ao céu. A chuva estava parando e o sol tentava aparecer.

- Você é um super-herói agora filho!

Ele estava me girando no ar. Eu pedi que me colocasse no chão e ele se ajoelhou diante de mim.

- Não quero ser super-herói. Não foi o “Super-Homem” quem me salvou. Foi você papai. Você é o meu herói!

Pude ver lágrimas escorrerem dos seus olhos. Abracei-o e dei-lhe um beijo no rosto. Ele me colocou nas suas costas e me levou pra casa. Enquanto eu estava ali percebi que não importa pra onde eu iria. Eu só queria estar perto dele, do meu super-herói; do meu pai.

Agnes Gomes
Enviado por Agnes Gomes em 28/07/2011
Código do texto: T3124289
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