ESSA É PRA PENSAR

ESSA É PARA PENSAR

Em minhas viagens à procura de novidades para as colunas de para as colunas de jornais, experimentei a sensação de “pasmo” ao fato abaixo:

Na cidade de Jaboatão, em Pernambuco, após longas caminhadas, todos os viajantes, como um recurso de sobrevivência à sede que aquele clima seco provoca, param num casebre à beira da estrada.

O poço fundo e quase que vazio parecia estimular ainda mais o desejo nos viajantes de beber água.

No galho seco havia um lindo papagaio, de um colorido colossal, em contraste com aquela paisagem castigada pelo sol. De um vocabulário rico, o papagaio atraia a todos que pôr ali paravam. As crianças pançudas, piolhentas, desprovidas de conforto, nada diferente em aspecto e do papagaio de nome Lito.

Percebi a chegada de uma família que ali parou, depois da admiração pelo Lito que após as ofertas para a compra da ave, as crianças corriam até a mãe, seguravam as barras de sua saia e diziam: “vendi não, mãe. E a ave resmungava no mesmo tom de súplica: Vendi não.mãe. ·Fiquei observando a família que insistia com a oferta tentadora, talvez pôr capricho. E como o dinheiro fala mais alto naquela região, Lito foi vendido. Aos choros as crianças deixavam as lagrimas se misturarem à poeira daqueles rostos marcados pela fome e miséria. Ainda ouvi a ave dizer num cabo da vassoura, já amarrada na mão da mulher vidrada pela vitória como se estivesse saindo de um leilão: Vendi não, mãe... E a mulher ria admirada pela sabedoria da ave. A mãe das crianças deu uma sacudida nos que choravam, contendo os soluços, transformando-os em resmungo abafados, derivados de uma tristeza inexplicável, e a saudade já fazendo parte de suas vidas miseráveis. ·Aquela cena tirou todo o meu entusiasmo de pesquisar a”. vida nordestina. Voltei para o hotel e tratei de marcar a viagem de volta. No aeroporto encontrei a família que comprara a ave. Rapidamente procurei pelo papagaio e soube que haviam embalado-o junto com as bagagens para não ser visto.

Ao chegar no Rio de Janeiro, fiquei parada, um sentimento estranho apossou-se de meu ser e a curiosidade de saber como a ave estaria após sair do bagageiro. Fiquei parada, a expectativa prolongou o tempo. A família já nem falava da ave. Traziam vários produtos nordestinos, a ave era apenas mais uma “coisa”.

Ouvi alguém dizer que deveriam verificar o papagaio. Ao abrirem a gaiola disfarçada em embrulho, alguém falou lamentando “que pena, o papagaio morreu”, talvez pôr falta de ar”.

Permaneci parada com o gosto das lagrimas presas à garganta, talvez as lagrimas das crianças nordestinas. Discretamente jogaram o embrulho do papagaio na lixeira luxuosa do aeroporto.

Nesse momento, uma musica suave tocava naquele ambiente, e em minha lembrança a voz do papagaio: Vendi não, mãe...

Lira Vargas.

Lira Vargas
Enviado por Lira Vargas em 04/07/2005
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